Família

Cada vez há mais famílias de “costas voltadas”

 
Aborda-se pouco este tema porque se parte do princípio de que a família é uma instituição sagrada e perfeita, mas os estudos demonstram que há cada vez mais casos de pais separados dos filhos, de irmãos que não se entendem e demais familiares que se mantêm à distância.

Os motivos para o afastamento são vários e, segundo os psicólogos, é preciso formar mais profissionais especializados para que possam ajudar nestes casos.
 
Os profissionais estão muito habilitados para tratar os problemas e para promover as reconciliações, mas há muitos casos em que não é esse o desejo dos pacientes, logo, é fundamental que se altere a estratégia e que se ajude quem precisa desse apoio, pois não é fácil viver afastado da família.
 
Por detrás do afastamento estão traumas de infância, maus-tratos que não se esquecem, problemas com heranças, rejeição do/a parceiro/a do filho/a, mal entendidos, críticas constantes ao estilo de vida dos filhos ou demais familiares, doença mental  e daí por diante.
 
Há situações em que os membros da família discutem e se afastam, mas também há casos em que não houve uma discussão e as pessoas permanecem sem um qualquer contacto.
 
Em muitas situações, esse afastamento é sugerido por um especialista em virtude dos prejuízos que a relação acarreta, noutros casos é a própria pessoa quem toma essa decisão por não conseguir suportar a relação e os danos que a mesma lhe causa em termos de saúde mental.
 
Note-se que, é muito complicada a tarefa de lidar com pais agressores e assumir que, as memórias de uma infância dolorosa não desaparecem só porque o tempo passou. Na mesma sequência, os psicólogos evidenciam que também não é fácil conviver com pais que não mudam de atitude, que continuam a tecer críticas ferozes aos filhos em virtude da má relação que se estabeleceu no passado, que é complexa a convivência com pais que deserdam os filhos e, não muito mais fácil é manter contacto com familiares que tiram partido de uma parte da família e que se colocam, em regra, sempre contra os mais novos.
 
Ao mesmo tempo, não é fácil lidar com uma sociedade que aponta o dedo aos filhos que se afastam dos pais e que entende que os progenitores não queiram falar com os filhos que seguiram um percurso diferente do seu, pelo que, este luto pelo afastamento familiar é muito doloroso.
 
Em muitos casos, os filhos concentram-se no seu tempo presente, aprendem a valorizar a sua nova família, constroem novas amizades e encontram uma força acrescida para seguir em frente.
 
Para os pais, por norma, o afastamento é doloroso sobretudo devido á pressão social, pois no caso dos pais agressores, o vínculo afetivo não apresenta muita qualidade. Segundo os especialistas, para os progenitores o afastamento é mais facilitado quando são estes a determinar a sua posição.
 
É também referido pelos especialistas que, tanto para quem se afasta como para quem teve de lidar com a decisão do outro, não é uma realidade fácil de enfrentar. Em muitos casos, ambas as partes sofrem em silêncio e desenvolvem stress pós traumático, no entanto, é comum que ninguém queira a reconciliação devido ás muitas memórias acumuladas e mal resolvidas.
 
Os mesmos técnicos afirmam que não é simples a decisão, pois em qualquer dos casos (seja manter uma convivência tóxica e que nos prejudica, seja promover o afastamento), qualquer uma das atitudes gera sofrimento, pelo que, estas pessoas precisam de desabafar livremente essa dor com um profissional que as entenda, precisam de identificar o que estão a sentir e de assumir essa decisão.
 
Há casos em que as pessoas querem voltar atrás e já não sabem como, mas também há muitos cenários em que nem se coloca essa possibilidade.
 
Muitos pais e filhos afirmam em consulta que, passado o tempo do luto, conseguem erguer-se e seguir a sua vida noutros moldes, mas também há quem relate não conseguir conviver com essa ausência.
 
A ciência diz que é preciso respeitar todas e quaisquer situações, incluindo aquelas que não ponderam a reconciliação e ajudar quem já sofre muito com os traumas do passado e que precisa de viver afastado dos pais ou de quem os promoveu. Ao mesmo tempo, é preciso apoiar quem se quer reaproximar e compreender que se trata de uma nova realidade social que precisa de ser interpretada convenientemente.
 
Refira-se que 27% dos norte-americanos vivem afastados de algum familiar significativo, como sendo pai, mãe, filho ou irmão e que, a sociedade ocidental é quem está a enfrentar mais casos de afastamento familiar sobretudo devido à mudança do estilo de vida, de mentalidades e de afirmação pessoal, já que se acredita que nem todas as famílias são positivas e fazem bem aos seus elementos. Aceitou-se que há famílias tóxicas e elementos que não conseguem conviver com determinados valores e comportamentos, pelo que, o afastamento tem vindo cada vez mais a ser uma realidade quando a convivência se torna insuportável.
 
Quem toma a decisão de se afastar da sua família biológica assume que é algo muito difícil e, na maioria das vezes, muito ponderado, já que, é quando se chega ao limite que se desiste, mas os danos para a saúde mental já são muitos. É nesse sentido que, os especialistas recomendam o apoio de um psicólogo cuja intervenção irá incidir no encontro da autoestima, na descoberta de um novo modelo de vida e na procura de alternativas ao tipo de relação prejudicial.
 
Os mesmos entendidos evidenciam que, apesar de poder parecer “estranho” e fora do comum que as famílias vivam distantes dos seus membros, a sociedade tem de estar preparada para aceitar e respeitar o percurso e os motivos de cada um e entender que, ninguém toma essa decisão sem que exista uma razão muito forte, por isso, «temos de oferecer a nossa compreensão e apoio», concluem.
 
Fátima Fernandes