Família

Como é que a família pode prejudicar a recuperação psicológica?

Foto|Freepik
Foto|Freepik  
É do domínio público que os problemas de saúde mental estão a aumentar em todo o mundo e que é preciso estar cada vez mais atento e desperto para esta realidade.

Estima-se que uma em cada oito pessoas no mundo sofra de algum distúrbio psicológico. Isso significa que muitas famílias se veem na situação de acompanhar o processo de recuperação de um ente querido.
 
Apesar desta realidade e do muito trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pelos especialistas, a verdade é que muitas famílias não aceitam a necessidade do do seu ente querido ter de ser apoiado psicologicamente, muito menos colaboram para que recupere da melhor forma.
 
Na base desta resistência familiar está a necessidade de manter a dinâmica do passado, o medo que o paciente fale dos problemas que viveu no seio familiar, a importância de afirmar o grupo como capaz de enfrentar todos os problemas e, acima de tudo, a crença de que os problemas se resolvem em casa e não na presença de “estranhos” ou terceiros.
 
Segundo os psicólogos, na maioria das vezes, os pacientes aceitam a terapia, apresentam progressos, mas assim que começam a melhorar, a família insiste na necessidade de desistir do tratamento por se sentir ameaçada e invadida na sua privacidade. Toma conta do seu ente querido como se estivesse à altura de o tratar e acredita mesmo que só a estrutura familiar é capaz de resolver os problemas, quando na realidade, é quase sempre nesse ambiente que residem as causas dos problemas psicológicos.
 
No fundo, os pais sabem disso e não querem que os maus-tratos venham a lume, muito menos lhes agrada a ideia de o filho ou filha desenvolver uma boa autoestima e autonomia e que comece a apresentar progressos, já que isso naturalmente faz com que a pessoa se liberte dos seus agressores e ganhe uma nova vida e um novo rumo.
 
É comum que muitos filhos se afastem dos pais para poderem seguir o tratamento psicoterapêutico e gozar dos seus benefícios, mas não menos recorrente é o facto de doentes abandonarem a terapia devido à pressão familiar.
 
São muitos os casos em que os pais não levam os filhos ao psicólogo, que dizem não poder pagar as consultas, que criticam o trabalho do profissional, que inventam motivos para cortar a relação estabelecida e acima de tudo, costumam dizer aos filhos que vão cuidar deles e de uma forma muito melhor que o psicólogo, mas esta atitude só agrava a situação, confunde o paciente e leva-o a desistir de um processo fundamental para a sua recuperação.
 
Este cenário ocorre com crianças mas também com adultos que enfrentem um problema psicológico e que tenham de conviver com a pressão e condenação dos pais face ao tratamento. Note-se que, em muitos casos, os progenitores nem conseguem perceber que o filho ou filha não está bem e que precisa de ajuda. Quando acaba por ter de se confrontar com essa realidade, apoia no início, mas à medida em que percebe que a terapia envolve contar problemas do passado, começa a negá-la, a rejeitar o profissional e a ameaçar o descendente caso ele queira continuar a falar da vivência familiar.
 
É frequente que os pais tratem mal os filhos como forma de pressão, que lhes retirem o pouco afeto que lhes davam e, em muitos casos que os ameacem até com dinheiro, razão pela qual se afirma que, em muitos casos, o sucesso da psicoterapia é comprometido pelas atitudes negativas da família.
 
Para inverter esta situação, é fundamental que se aborde cada vez mais o assunto, que se explique aos familiares a importância de aflorar os problemas para os poder resolver e que todos podem ser beneficiados com esse apoio psicológico. Idealmente, a intervenção deve também incluir a terapia familiar, por forma a envolver os pais no processo, sublinham os especialistas.
 
Os progenitores devem aceitar que não há relações perfeitas entre pais e filhos, que há problemas, que houve desconhecimento em muitas matérias, que se cometeram erros, mas que, em conjunto, se podem encontrar novas respostas. Os pais podem sempre aprender algo com essa  intervenção psicológica e melhorar a sua relação com o filho ou com a filha, têm é de estar disponíveis para tal e permitir que os filhos falem livremente sobre o que sentem, pois caso contrário, dá-se o agravamento da situação, em muitos casos o filho não consegue ser autónomo e prosseguir a sua vida ou, no limite, acaba por se afastar dos pais para poder seguir em frente com o seu tratamento e encontrar um rumo para a sua vida.
 
Fátima Fernandes