Comportamentos

Como voltar a confiar em alguém?

 
Existem dois grandes motivos para que vivamos sentimentos de desconfiança nas nossas relações: uma infância pouco dada a afetos e a vínculos emocionais de qualidade e, as marcas que vamos acumulando como resultado de deceções e expetativas muito elevadas que colocamos nas relações com os outros ao longo do nosso percurso.

Em muitos casos, são conjugados estes dois aspetos, o que ainda dificulta mais a capacidade de confiar em alguém.
 
Na posição dos especialistas, «estas feridas precisam de ser tratadas para que se consiga dar lugar a novas vivências e experiências, pois ninguém merece viver isolado do mundo». Para tal, é preciso ir ao fundo dos nossos traumas, identificar as suas causas e perceber que, também temos de ganhar força e autoestima suficientes para mudar algo em nós.
 
Para a psicologia «a culpa nunca está só num lado da barricada, o que quer dizer que, quando alguém se desilude, é porque também se iludiu com outra pessoa»; é porque também esperou demais, é porque exigiu demais e daí por diante.
 
Ao mesmo tempo, temos de ter em conta que, todos temos ritmos e formas de viver as relações pelo que, saber respeitar o tempo do outro ajuda a reduzir a ansiedade e as expetativas.
 
Um exercício importante a realizar é ir ao fundo de nós e ouvir o que a nossa mente tem para nos dizer. É sermos capazes de perguntar a nós mesmos a razão pela qual entramos em descrédito com algumas pessoas ou com as pessoas em geral, como acontece em muitos casos. Muitos psicólogos relatam que, em consulta, são muitos os pacientes que se dizem sem amigos e sem esperança de iniciarem novas relações sejam elas de amor ou de amizade. Tal acontece porque «as pessoas foram acumulando as marcas do tempo, as feridas das deceções e, por não identificarem esses pontos, acabam por desistir das relações». Mas, «não podemos isolar-nos do mundo. O ser humano é social e precisa de viver relações de maior e de menor intimidade com os outros». Para isso, precisa de curar essas feridas, reforçam os especialistas.
 
Muitas vezes, o ato de desabafar com um amigo aquilo que sofreu com outro, «apenas aumenta o mau-estar que se sente em relação a essa pessoa». É preferível dialogar connosco próprios e, de forma isenta, chegar ao fundo das questões. Qual a razão pela qual me desiludi com aquela pessoa?, Porque tive expetativas tão elevadas que quase fiz um “endeusamento” daquela pessoa? Perante estas questões, vamos perceber que também não fizemos tudo da forma mais correta e que, o outro também não consegue corresponder àquilo que esperamos dele. Ao mesmo tempo, percebemos que, nós também não somos perfeitos e que também erramos, seja nas expetativas, seja nos excessos de atenção e de exigência, por isso, temos de encetar novas relações, mas com a aprendizagem adquirida nas anteriores.
 
Se encararmos as relações com mais simplicidade e naturalidade, certamente que construímos o necessário desapego que nos protege. Temos de ter em mente que, uma relação não é a “tábua de salvação” para os nossos problemas, muito menos o nosso único interesse na vida. Se for um amor, terá de ser partilhado, com prudência, criatividade e alimento moderado, pois tal como numa amizade, o sentimento terá de ser livre e descontraído, pois afinal procuramos pessoas com as quais nos identifiquemos, mas não dependamos.
 
Quer isto dizer que, temos de reaprender a dar e a receber sem exigir que o outro nos devolva exatamente aquilo que lhe damos e, ao mesmo tempo, perceber que não mudamos ninguém, pelo que uma qualquer relação não se deve pautar por essa ideia falsa de que o outro terá de ser como nós. Aprendemos com o que o outro nos traz de inovador e diferente, não tentando mudá-lo e colocá-lo à nossa maneira.
 
Já reparou que, nos desiludimos com as pessoas, mas que temos sempre pontos a melhorar em nós mesmos para evitar que as novas relações sejam pautadas pelos mesmos erros. Com cada relação que experimentamos devemos ter a humildade de aprender algo novo para podermos ter entusiasmo para iniciar outra experiência. Tal acontece com a amizade e com o amor. Se pararmos para pensar e analisar, vamos ver que há sempre aspetos a melhorar, há sempre pessoas diferentes com quem aprender algo novo, há sempre novas oportunidades para nos conhecermos melhor, por isso, não podemos desistir de nós mesmos, nem dos outros!
 
Caso não consiga ultrapassar este processo sozinho, procure apoio psicológico, pois acima de tudo, é a sua recuperação que está em jogo, é a importância da sua autoestima que ganha expressão e, é o voltar a confiar em si mesmo que se supera para que possa confiar em alguém. Ao tratar as feridas será capaz de acreditar mais em si mesmo e nos outros.
 
Fátima Fernandes