Curiosidades

“Diz-me com quem andas que eu digo-te quem és”

 
É célebre o dito popular que associa a escolha dos amigos à nossa personalidade.

Tal acontece porque, seja pela educação que recebemos, seja pelas oportunidades que tivemos e pela falta delas, tendemos a aproximar-nos ou a afastar-nos de algumas pessoas para que nos sintamos mais confortáveis.
 
Na posição dos entendidos nesta matéria, apesar de parecer linear que façamos escolhas em função daquilo que somos e sentimos, a verdade é que também temos de ter uma palavra a dizer no processo, pois nem sempre as pessoas que nos acompanham são a melhor opção, já que nem sempre somos tratados como gostaríamos, por isso, torna-se essencial que, de vez em quando, façamos uma reflexão sobre o assunto e que tentemos responder a algumas questões para melhor nos situarmos nas relações.
 
Depois, é fundamental anotar que,  começamos a fazer amizades na infância e crescemos com a ideia de que temos de ser amigos de toda a gente. Esse facto não nos dá muita margem de manobra para que sejamos críticos e para que façamos as melhores opções, pois acabamos por receber quem nos aparece, seja pelo contexto em que estamos inseridos, seja por sugestão dos nossos pais e até pelas necessidades que sentimos numa determinada fase do nosso desenvolvimento.
 
Muitas vezes, nem pensamos se estamos ao lado das melhores pessoas ou se as mesmas nos podem prejudicar de alguma forma. Habituamo-nos a estar nesse grupo mais ou menos alargado e seguimos sem muito bem analisar as pessoas.
 
Em muitos casos, podemos ser alvo de manipulação, de agressões de algum tipo, mas como a pessoa é nossa amiga, torna-se quase como que intocável e inquestionável.
 
Só quando acontece algo de mais grave é que refletimos sobre o assunto e tomamos uma decisão, no entanto, há quem prolongue essa situação tóxica pela vida fora pela falta de coragem para fazer um corte com aquilo que o prejudica.
 
Se é verdade que um amigo é um tesouro, também é um facto que podemos fazer parte de uma relação destrutiva e que nos orienta para um sentido errado, pelo que, não devemos de forma alguma, colocar os amigos num pedestal, muito menos deixar passar o tempo e as situações sem que tomemos uma atitude consciente e firme, alertam os entendidos.
 
Assim, torna-se essencial fazer-se a si mesmo estas questões:
 
1. A amizade é recíproca?
 
Esta é logo a primeira questão que nos devemos fazer a par da ideia de que as amizades devem ser justas e honestas para que a relação seja um vínculo forte e enriquecedor para ambas as partes.
 
Se o leitor sente que dá muito e que não consegue receber algo semelhante dos seus amigos, isso pode indicar que criou expectativas muito elevadas em relação a essas pessoas e que as mesmas não estão disponíveis para dar dessa forma. Perante esse facto, terá de refletir acerca dessa sua disponibilidade e dar apenas a mesma medida que recebe, sob pena de estar sempre a sentir-se desvalorizado. Na posição dos especialistas, temos de ser realistas em relação a nós próprios e aos outros, sob pena de não vivermos amizades, mas sim relações desequilibradas em que os outros se aproveitam dessa nossa capacidade de dar infinitamente. Temos de nos proteger e de ser mais conscientes, sublinham os entendidos.
 
É ainda de registar que, uma pessoa que se dá demasiado aos outros tem dentro de si uma enorme necessidade de agradar para que se possa sentir acompanhada e rodeada de amigos, o que também não é uma base correta para se viver uma amizade verdadeira. Essa carência excessiva acaba por resultar num abuso por parte de pessoas mal intencionadas e desencadear muitas injustiças. Aprenda a dar aquilo que recebe e verá que será mais livre e feliz e que terá melhores pessoas à sua volta.
 
2. Os meus amigos respeitam-me?
 
Estabelecer limites numa qualquer relação também constitui um ponto fulcral para que a mesma  decorra de forma saudável. Não faz qualquer sentido que, os seus amigos o procurem apenas quando precisam, que lhe peçam ajuda em momentos também delicados para si, que não respeitem o seu tempo e espaço, que lhe peçam tudo e mais alguma coisa sem que tenham em conta o seu lado, as suas necessidades e prioridades. Uma amizade tem forçosamente que ter limites, por isso, não seja o que os outros esperam de si, mas assuma-se tal e qual como é; com as suas prioridades, necessidade e disponibilidade e vinque isso muito bem para evitar faltas de respeito. Ao mesmo tempo, siga esse exemplo em relação aos demais: respeite-os para que também seja respeitado.
 
Na posição dos especialistas, as pessoas com medo do abandono e de ficarem sozinhas, têm uma grande dificuldade em colocar limites nas suas relações. Começam por mostrar-se sempre disponíveis, por fazerem tudo mesmo quando não querem ou não podem e, chegam a um ponto em que já não conseguem controlar os pedidos e as exigências dos demais. Aprender a estabelecer limites também nos torna melhores pessoas e mais fortes, evidenciam os mesmos entendidos.
 
3. Os seus amigos tratam-no com amor e consideração?
 
A forma como os nossos amigos nos tratam e sermos capazes de analisar a relação e a sua qualidade, é a base para que mantenhamos relacionamentos significativos e, ao mesmo tempo avaliarmos a nossa autoestima. Alguém que é maltratado por um amigo, é certamente uma pessoa que não se prioriza e que não gosta suficientemente de si mesmo. Uma relação de amizade tem de ser alicerçada por laços afetivos, por respeito e consideração mútua, caso contrário, é abusiva e toxica.
 
Quando os nossos amigos não nos tratam com respeito, isso não quer dizer que tenhamos algum problema e que sejamos piores pessoas, mas sim que não os escolhemos bem, que não fomos exigentes e que não nos respeitamos a nós próprios. Pode parecer estranho, mas para sermos amigos de alguém precisamos de possuir uma boa autoestima e valorização pessoal, sob pena de sofrermos mais com a amizade do que retirarmos benefícios dessa convivência.
 
Ser amigo é também uma escolha consciente e responsável que deve incluir respeito e consideração de parte a parte. Quando não temos uma boa autoestima, mais facilmente seremos usados e mais nos afastaremos do que constitui uma verdadeira amizade. Todos merecemos ser bem tratados nas mais variadas relações, por isso, priorize-se!
 
4. Há quanto tempo dura a amizade?
 
Neste ponto é interessante saber se os seus amigos são recentes ou se essa relação o acompanha desde a infância até ao presente, já que isso pode dizer muito a seu respeito.
 
Se o leitor mantem os seus amigos de infância ao longo de todos estes anos, isso pode querer dizer que, gosta de relações duradouras, estáveis e seguras, que valoriza muito a amizade, que reconhece características muito positivas nas pessoas que escolheu para serem suas amigas ou, pelo contrário, que se acomodou, que não tem refletido muito acerca das suas relações interpessoais e que aprendeu a aceitar e a resignar-se. Lembre-se que, em muitos casos, não é positivo manter uma relação no tempo quando a mesma nos é prejudicial ou nos habituou a um determinado modelo que envolve sofrimento.
 
Se o leitor tem mudado muito o seu círculo social ao longo dos anos, isso pode indicar que evoluiu e que precisou de contactar com pessoas novas, que mudou e que que precisou de estabelecer novos contactos, que não estava feliz nas suas relações e que ganhou coragem para se desligar e procurar novas pessoas, que naturalmente foi perdendo o contacto e que fez pouco para alterar essa situação por desinteresse mútuo, porque mudou de cidade ou de país ou porque acumulou cenários negativos e decidiu cortar com os velhos conhecimentos e dar-se oportunidade de descobrir novas pessoas. Na mesma lista de razões que nos levam a mudar muito de amigos também podem estar problemas como: dificuldades em chegar a acordo com os demais, inflexibilidade, intolerância, não conseguir estabelecer limites, não se dar ao respeito ou não ser capaz de o fazer aos outros, sentir dificuldades em gerir conflitos ou ser uma pessoa excessivamente exigente com os demais.
 
5. Quantos amigos tem?
 
Este ponto também pode indicar muito a seu respeito. Por norma, as pessoas mais extrovertidas reúnem um grupo de amigos mais amplo, enquanto que quem é mais tímido se fica por um grupo mais restrito. Ao mesmo tempo, há pessoas  que preferem ter menos amigos e dar-lhes mais atenção e disponibilidade, construindo relações mais profundas e significativas, enquanto que, há outras que gostam mais da qualidade do que da quantidade.
 
Na mesma sequência de explicações para este aspeto, alguns  estudos descobriram que o número de amizades diminui consideravelmente a partir dos 25-30 anos e que os homens tendem a ter mais contactos do que as mulheres.
 
Além disso, não nos podemos esquecer que sustentar uma amizade exige um investimento de tempo e emoções e, como os nossos recursos cognitivos são limitados, não podemos ser íntimos de muitas pessoas. Os  trabalhos do antropólogo, psicólogo e biólogo Robin Dunbar sugerem que as amizades íntimas situam-se entre 3 e 5 pessoas. A partir daí, temos outros tipos de grupos (bons amigos, amigos, conhecidos…) que vão ficando maiores, mas com menos envolvimento emocional.
 
Dessa forma, para manter as verdadeiras amizades, devemos restringir-nos a limites que nos permitam atendê-las e cultivá-las. E é especialmente nesse pequeno grupo que a escolha dos amigos se torna singularmente importante. Quando vivemos uma verdadeira amizade, não nos preocupamos com o número de pessoas que temos ao nosso redor, mas sim com a qualidade da relação que estabelecemos, o que também diz muito do que somos: ou mais afetuosos e dedicados ou mais desapegados e apostados na mera diversão e companhia.
 
Por fim, importa rematar que, a cada pessoa cabe a escolha, o importante é que se sinta bem com as suas opções.
 
Fátima Fernandes