Família

Não obrigue o seu filho a beijar os familiares!

 
É muito comum que os pais obriguem os filhos a abraçarem e a beijarem os familiares mesmo contra a sua vontade, mas será que isso é correto?

Em muitas famílias nem sequer se põe em causa este gesto, uma vez que é cultural que os mais novos beijem os adultos mesmo contra a sua vontade, mas os entendidos na área da psicologia alertam para o erro dessa atitude.
 
É um facto que é importante ensinar bons valores e uma boa educação desde cedo, ainda assim, existem outras formas de cumprimentar os adultos como seja um delicado “olá” ou um aperto de mão.
 
Na posição dos especialistas, é complicada a tarefa de obrigar os filhos a beijarem e a mostrarem emotividade com familiares mais ou menos diretos, sobretudo porque não se está a respeitar a vontade da criança e, acima de tudo, os pais estão a mostrar-lhes que têm de ser afetuosos com todos os adultos, o que não protege as crianças de eventuais abusos no futuro.
 
Vejamos a mensagem que se transmite aos mais novos: “tens de beijar o tio”, “dá um abraço ao avô”, “dá um beijinho à avó”. Quando a criança sente esse desejo, é aceite, quando o gesto é forçado, passa-se a imagem de que “tem de ser assim”, facto que a criança não consegue entender e que regista como sendo uma obrigação.
 
Pensando bem, que prazer têm os pais quando estão a impor um gesto carinhoso aos filhos? Que alegria sentem os familiares quando sabem que a criança foi obrigada a cumprimentá-los de uma forma mais carinhosa? Não será mais fácil orientar a criança para uma educação que contemple uma saudação ou um aperto de mão?
 
É verdade que a maioria de nós que hoje somos pais, crescemos com esta obrigatoriedade de distribuir beijos e abraços a todos, razão pela qual, muitos de nós não aprendemos a diferenciar o que é uma imposição daquilo que realmente nos é prazeroso e, em caso de abuso, não soubemos até que ponto poderíamos ter negado aquelas carícias de adultos, muitas vezes até de  familiares próximos, porque era obrigatório ter de dar afeto a todos.
 
É fundamental que a criança cresça e se desenvolva com a garantia de que é dona do seu corpo e que jamais será forçada a qualquer gesto de afeto ou carinho. Ao mesmo tempo, a ideia de ter de beijar todos os adultos, familiares ou não, induz na criança a noção de que também pode usar esse gesto carinhoso para obter o que pretende.
 
Se os mais novos souberem que a avó fica muito contente com um beijo, pode muito bem dar-lhe esse gesto em troca de dinheiro ou de outras recompensas, o mesmo se passa com os restantes familiares que, muitas vezes, usam doces como forma de persuadir os mais novos, o que pode dar lugar a vários tipos de abusos.
 
Nesta sequência, Katia Hetter, autora do artigo da CNN ,“Eu não sou dono do corpo do meu filho” diz que o carinho forçado é capaz de obrigar a criança a tocar as pessoas quando não quer, tornando-a vulnerável ao abuso sexual.
 
Dessa forma, quando se “viola a zona de conforto de uma criança”, ela pode aprender a aceitar qualquer um nesse espaço incómodo.
 
Segundo a mesma autora, «uma criança nunca deve ser tocada caso se sinta desconfortável, mesmo que sejam membros da família.  Os beijos e abraços da criança só a  ela pertencem e não são obrigatórios, aliás, jamais podem ser encarados como uma obrigação, pois caso contrário, transmite-se uma ideia incorreta de afetividade», sublinha a mesma especialista.
 
Os pais devem respeitar a escolha da criança. É ela que decide a quem quer dar um beijo ou um abraço, pois o corpo é seu e a liberdade de demonstrar carinho só a si lhe compete.
 
A especialista da CNN também afirmou que forçar as crianças a mostrar carinho quando não querem tem um impacto nas suas relações durante a adolescência. Isso porque “se os pais ensinarem uma criança a usar o corpo para satisfazer alguém por causa da autoridade, ela fará o mesmo sob a autoridade de qualquer um”.
 
Perante esta constatação, os pais devem mudar de mentalidades e colocarem-se em defesa dos filhos assumindo que os familiares podem ficar aborrecidos, mas que o supremo direito da criança será respeitado. Os progenitores devem aprender a dizer cumprimenta, diz “olá” ou dá um aperto de mão. É simples, respeitoso e assegura que os direitos da criança também são salvaguardados.
 
Por fim, anote que é importante que a criança aprenda a proteger o seu corpo e isso regista-se através do exemplo dos pais. Os progenitores não devem tocar nos genitais da criança quando ela já consegue lavar-se sozinha, não devem obrigá-la a beijá-los e não devem fazer demonstrações de carinho com a tónica da autoridade, como é o caso de “tens de dar um beijo á mãe, senão fico aborrecida contigo ou não ganhas um presente”.
 
Todas e quaisquer manifestações de carinho, mesmo entre pais e filhos, devem surgir com naturalidade, com prazer de ambas as partes, é essa a conclusão que se retira deste apontamento e que se deve estender a todos os adultos, pois a criança é dona do seu corpo e tem de zelar por si e pelos seus sentimentos e, isso aprende-se desde cedo.
 
Fátima Fernandes