Família

O drama de filhos adultos que continuam a sofrer maus-tratos dos pais

 
Muitos pais abusaram dos filhos em crianças e permanecem com a mesma postura mesmo depois de estes serem adultos e, em muitos casos, depois de já terem saído de casa e de terem construído a sua família. Nesta fase de vida, é de maus tratos psicológicos que se trata, uma vez que, estes pais usam a manipulação, a humilhação, a ofensa, a crítica feroz e destrutiva para prejudicarem a vida dos filhos.

Estes pais são tóxicos e abusadores ao mesmo tempo. São pessoas mal resolvidas, que também carregam os seus dramas de infância, que não resolveram os seus problemas e que os transferiram para os filhos. Como não mudam, continuam a cometer os maus-tratos mesmo depois de os filhos serem adultos e, teoricamente independentes em termos financeiros, mas dependentes em termos emocionais.
 
Como foram muito mal tratados em pequenos, mas não tomaram consciência desses abusos no tempo certo, estes filhos vivem estas relações sufocantes com alguma naturalidade, pois não conheceram outro modelo ou, mesmo que tenham visto outras formas de educar diferentes noutros pais de amigos, sempre acreditaram que o seu modelo era diferente e que, por algum motivo, teria de ser assim. Em muitos casos, estes filhos têm uma autoestima tão fraca e tantos problemas emocionais que nem se dão conta de que não merecem este sofrimento. Só quando vivem um problema maior é que estas feridas vêm a lume. É nessa ocasião que pedem ajuda, que fazem tratamento psicoterapêutico e que ganham coragem para enfrentar a sua dura realidade.
 
Tendo por base uma publicação da revista A Mente é Maravilhosa, percebe-se que, muitos pais abusam dos seus filhos adultos e que, «essas dinâmicas invisíveis podem minar completamente a vida daqueles homens e mulheres que permanecem subordinados aos seus progenitores».
 
A mesma fonte clarifica que, a manipulação, a chantagem, as palavras que doem e magoam, os comentários que continuam a alimentar a mesma insegurança da infância, sem esquecer a constante comparação com outras pessoas e, em muitos casos, irmãos ou outros familiares, continuam a destruir quem precisa de seguir o seu caminho e dar um sentido à sua vida.
 
Realça a mesma revista que, às vezes, com a maturidade, os laços que magoam «não são cortados ou reparados e as mesmas dinâmicas continuam a ocorrer». Como consequência disso, deparamo-nos com a diminuição da autoestima e até da própria qualidade de vida.
 
É ainda de anotar que, o abuso psicológico tem muitas formas e recai sobre vários tipos de vítimas. Há os idosos que sofrem maus-tratos dos filhos, os filhos que sofrem com os efeitos de uma educação prejudicial e há também os homens e mulheres que, mesmo tendo atingido a maturidade e até a independência do lar, «continuam a ser submetidos ao tratamento agressivo de um pai, de uma mãe ou de ambos».
 
Para a equipa de psicólogos da mesma revista, é preciso pedir ajuda junto das entidades competentes, sejam os serviços sociais, as autoridades ou as instituições de apoio à vítima e permitir que a pessoa em causa fale sobre o seu drama de vida, passe por um tratamento e siga um novo percurso.
 
Em muitos casos, a dificuldade em pedir ajuda passa pela incapacidade de tomar consciência do problema que se vive. Como já dissemos acima, muitos filhos, por terem sido sempre mal tratados desde a  infância, acreditam que esse é o seu modo de vida e lidam com esse sofrimento como se de algo normal se tratasse. Neste ponto é de evidenciar a relação que o agressor estabelece com a vítima. É uma relação de dependência, é um vínculo difícil de cortar porque há um hábito instalado, há muito medo e uma fraca autoestima, para além de uma estranha forma de amor; um amor envenenado.
 
A Mente é Maravilhosa sublinha que, «os efeitos desse tipo de realidade são imensos». Em primeiro lugar é de reter que, os maus-tratos e o abuso psicológico como qualquer comportamento que visa controlar e subjugar outro ser humano por meio do uso do medo, manipulação, humilhação, intimidação, projeção de culpa, coerção e até desaprovação constante «é completamente reprovável» e requer uma atenção especial para que possa ser identificado e tratado.
 
Depois, é de ter em conta que, estas formas de agressão não deixam marcas na pele, pelo que são muito difíceis de provar e de curar, no entanto, comprometem a integridade psicológica do indivíduo. Sublinha a mesma revista que, o impacto na mente de uma criança, por exemplo, pode ser devastador. Se, além disso, este tipo de situação perdurar por décadas, já é possível imaginar a dimensão do dano, a alteração de aspetos tão básicos como a autoestima, identidade, segurança pessoal, etc.
 
Anota a mesma publicação que, o abuso psicológico de pais sobre filhos adultos «não surge de um dia para o outro», mas sim responde a uma dinâmica que tem  a sua origem na infância. Isso explica porque muitas pessoas chegam à idade adulta com uma dura “bagagem” emocional, com um histórico de abusos psicológicos que deixa, em muitos casos, a sombra de um transtorno de stress pós-traumático.
 
No entanto, o mais impressionante é que esses adultos geralmente fazem esforços notáveis para parecerem normais. Poucas pessoas no seu ambiente imediato sabem desses factos. Às vezes, nem os amigos mais próximos sabem dessa dor permanente que se guarda e carrega. Em muitos casos, o cônjuge apercebe-se e começa a estranhar o tipo de relação que se vive com os pais e, aí pode estar um ponto de alerta quando a vítima aceita ser apoiada.
 
Assinala a mesma revista que, «quando os monstros são os pais e normalizamos os maus-tratos, surgem questões como: porquê a mim? Ou será que isto é verdade?, pelo que o principal trabalho do técnico é fazer a vítima compreender a sua realidade e elevar-lhe a autoestima para que comece a construir uma visão diferente de si mesma para que possa reagir. Note-se que, em muitos casos, as feridas são tão profundas que o processo é mais lento e demorado, mas vale sempre a pena iniciá-lo, pois certamente que a qualidade de vida vai agradecer e compensar.
 
É importante o filho ou filha adulta perceber que, os pais não mudam; para eles é como se de uma criança se tratasse, quem tem de mudar é ela e, para isso, terá de receber apoio especializado já que se trata de um processo complexo onde o medo é o principal indicador.
 
Depois, a vítima teme ser ainda mais rejeitada, teme o desprezo, a crítica e o vazio, mas ao mesmo tempo, já não suporta a humilhação e os maus-tratos psicológicos. É nesse conflito que vai acabar por aceitar o apoio e uma nova orientação de vida.
 
A Mente é Maravilhosa alerta ainda que, «os monstros não se transformam em pessoas boas com o passar dos anos». E, com medo, os filhos adultos ainda mostram necessidade de receber o seu controlo e poder, já que assim foram habituados há muitos anos e isso acabou por lhes fazer parte da personalidade. São dependentes destes pais agressores e “poderosos” e sentem dificuldade em viver sem essa autoridade. Claro que é nessa base que os pais continuam a cometer os maus-tratos; sabem a dependência e a carência dos filhos.
 
A mesma revista sublinha ainda os efeitos psicológicos que estes pais provocam nos filhos:
 
Relações afetivas problemáticas e insatisfatórias.
 
Baixa autoestima, sentimento de inutilidade, destruição do orgulho, segurança pessoal ou motivação
 
Repressão emocional, tendência para esconder as próprias emoções.
 
Episódios de ansiedade, stress, distúrbios do sono, etc.
 
O que se pode fazer?
 
A mesma revista diz que, o filho adulto tem de ter plena consciência desse abuso e da necessidade de enfrentar a situação. Muitas vezes, por trás dessas realidades, a dependência está oculta, tanto emocional como financeiramente (há muitas filhos que não podem sair de casa devido a problemas financeiros).
 
Da mesma forma, por vezes, embora sejam independentes financeiramente, o vínculo do abuso permanece evidente, mas de forma clandestina através da manipulação, crítica em relação a cada decisão tomada, diante do parceiro escolhido, etc. É necessário assumir que «essas situações não podem e não devem continuar», adverte a mesma fonte.
 
Perante esse facto, há apenas duas opções: «evidenciar a realidade diante dos pais agressores e cortar definitivamente o relacionamento, ou diminuir o contacto e reduzir a comunicação ao mínimo necessário».
 
Além disso, e não menos importante, A Mente é Maravilhosa recomenda que, «os filhos de pais abusivos precisam de ajuda psicológica». Todas essas décadas de sofrimento e humilhação «deixam uma ferida profunda que deve ser tratada». O objetivo é recuperar a autoestima e a segurança pessoal para construir uma vida própria, independente, madura e feliz, concluiu.
 
Fátima Fernandes