Família

Os filhos não são cópias dos pais

 
Os filhos nem são cópias dos pais nem podem ser aquilo que os pais queriam ser e não conseguiram. Os filhos são seres únicos e especiais, têm a sua personalidade, a sua liberdade de escolha e de decisão sobre o seu percurso.

 
É verdade que planeamos, desejamos e permitimos que uma criança chegue ao mundo e que nos chame “pai” ou “mãe” e que isso nos encha de orgulho por sentirmos que esse novo ser será uma extensão de nós próprios, mas de forma alguma o poderemos considerar como alguém que, tal como uma esponja, vai absorver tudo o que queremos e que o vai reproduzir da maneira que pretendemos. Muito pelo contrário, é missão dos pais permitir que os filhos vivam os seus talentos, façam as suas descobertas, que aprendam com eles, mas que desenvolvam as suas capacidades e qualidades. Cabe aos pais oferecer uma educação de qualidade, rica e diversificada, o mais possível ajustada à sua idade para que a criança possa descobrir-se ao mesmo tempo em que se confronta com o mundo.
 
Neste sentido, não tem qualquer razão de ser a ideia de que os filhos vão ter de “seguir as pegadas” dos pais e ainda menos, serem aquilo que os pais não tiveram oportunidade de ser. É verdade que, as crianças nascem sem manual de instruções, tal como é certo que não há um bom livro capaz de modificar um comportamento de um pai ou de uma mãe. Os pais seguem aquilo que sentem dentro de si mesmos e aprendem a adotar novas formas de ser e de estar em função daquilo que vão aprendendo com as suas experiências, com os escritos e com o que ouvem “daqui e dali”, mas vão sempre encaixar esses conteúdos à sua essência e jamais aprender tudo de novo só por lerem um livro.
 
A mãe começa por imitar aquilo que aprendeu com a sua mãe e, só terá oportunidade de aplicar o seu próprio estilo com a experiência que vai reunindo a partir daí. O mesmo se passa com o pai que terá sempre como ponto de partida a sua própria experiência. A partir dessa base é que os livros poderão fazer algum sentido quando fazem refletir e não quando apresentam teorias “feitas” e que resultaram com muitas outras pessoas. Dentro de cada um de nós está uma personalidade, um estilo, um modo de vida e uma experiência que se acrescenta, não que se altera. O mesmo se passa com os nossos filhos. Eles aprendem o mundo através dos pais, mas depois vão procurar acrescentar esses conteúdos com novas experiências, sem esquecer que, como estão em grande desenvolvimento, vão ter muitos centros de interesse ao mesmo tempo e muitas ideias a girar em torno da sua criatividade. Perante tudo isto, resta aos pais recordarem-se de como foi a sua etapa análoga, como reagiram enquanto filhos na mesma circunstância para melhor conseguirem entender os seus filhos e criar uma boa empatia.
 
Esta é a recomendação para qualquer fase de vida, sabendo que raramente alguém segue um conselho por muito bom que seja. As pessoas tiram ideias daquilo que ouviram, acrescentam esses novos saberes e adequam-nos à sua personalidade e estilo de vida. Por essa razão também não faz qualquer sentido comparar o filho a outro membro da família, já que isso o está a condicionar de ser único e especial e de poder desenvolver as suas próprias qualidades e características.
 
Na posição dos especialistas, é um erro comparar a criança ou o jovem, especialmente nas características negativas já que o sujeito aprende a não gostar de si por ser como aquela pessoa com tal qualidade negativa.
 
Para os entendidos na matéria, os pais devem ajudar os filhos a se conhecerem e a melhor se posicionarem no mundo. Devem fornecer “a cana para que eles aprendam a pescar”, ou seja dar os conteúdos para que eles se sintam livres para aprender a aplicá-los em cada contexto de vida e à sua medida. Ensinar é mesmo isso, é fornecer o conhecimento e permitir que cada um o utilize o melhor possível. Como o processo de aprendizagem é longo, os pais devem colocar-se no lugar do filho, conversarem com ele e, em conjunto, discutirem as melhores formas de resolver os problemas, não impor uma vontade, pois isso só os irá afastar de si e daquilo que se pretende que é uma educação equilibrada e saudável.
 
Perante esta tomada de posição, os pais estão preparados para reformular quando se apercebem de um erro, são capazes de manter a sua autoridade e experiência de vida para ajudar a melhor encaminhar os filhos. Estes confiam na sabedoria dos pais e recebem os seus ensinamentos, apesar de os ajustarem ao seu contexto. Os pais devem permitir esta natural liberdade, já que é assim que os mais novos aprendem por si a enfrentar a vida, devem garantir a segurança, alertar para os perigos, transmitir os valores e, ao mesmo tempo, procurar perceber se a criança ou o jovem está a compreender o que lhe é transmitido.
 
Um outro ponto essencial é o diálogo com os nossos filhos. Ajudá-los a obter respostas, mais conteúdos, permitir que eles apresentem as suas dúvidas e as suas soluções para os problemas, já que, desta forma, eles acatam o que os pais lhes dizem, mas procuram também encontrar as suas respostas em cada idade e fase de vida. Não nos esqueçamos de que os filhos precisam de se sentir livres e presos ao mesmo tempo. Por um lado, precisam de sentir que têm liberdade para serem tal como são e, por outro necessitam de sentir o amor e a compreensão dos pais, ao mesmo tempo em que afirmam também os seus sentimentos.
 
Neste contexto, temos de estar atentos para não projetar os nossos próprios desejos não realizados nos filhos e, ao mesmo tempo, para nos conseguirmos abstrair dos nossos próprios interesses quando lhes damos um conselho.
 
Um pai ou uma mãe que esteja em competição com o filho pela sua idade, por aquilo que espera dele, jamais conseguirá ser isento e honesto na sua opinião, pois o que lhe vai dizer será sempre uma necessidade pessoal e estará sempre recheado de ciúme, de competição e de sentimentos negativos e, os filhos percebem isso. Esta situação degrada a relação até que os pais compreendam o que estão a fazer e possam modificar o seu comportamento. Quando o fazem, por norma, os filhos também acatam e assumem as suas falhas. Dessa maneira em muitos casos, resolvem-se muitos problemas quando os “estragos” não são muito grandes nem muito duradouros.
 
Para um filho é muito importante sentir que os pais o amam, que o aceitam e que o respeitam mesmo que ele falhe. É também fundamental sentir que o pai ou a mãe assume um erro, que procura corrigi-lo e melhorar a relação. Os pais também precisam de sentir esse perdão e compreensão por parte dos filhos para poderem avançar e modificar-se. Voltamos à importância do diálogo franco e sincero entre pais e filhos que é a base para que a relação se mantenha, que seja feliz para todos e muito baseada no respeito, na compreensão, no estabelecimento de regras e de limites que são elementares em qualquer relação humana.
 
Os pais devem procurar ser honestos com os filhos, nem que para isso, tenham de fazer o seu auto-exame para que percebam se estão realmente a ser sinceros, ou se estão a tirar partido pessoal através do seu conselho. Muitas vezes, conversar abertamente com o filho e até colocar-se no lugar dele, permite que essa genuinidade e honestidade tomem conta do momento e, os mais novos sentem isso como ninguém. É dessa forma que uma relação progride sem “outros interesses” por detrás e com a verdade que se pretende.
 
Ao mesmo tempo, os pais não se podem esquecer do quanto os filhos os amam e que isso se pode perder quando a verdade emocional e a sinceridade não existem. Os pais são mais velhos, são um exemplo de autoridade, mas isso não quer dizer que os filhos vão ser exatamente assim ou que têm de ser mesmo assim. Os mais novos aprendem com os pais e depois constroem o seu sentido, isto é normal, razão pela qual não podemos esperar que os filhos sejam exatamente aquilo que somos e que desejamos. Se pensarmos bem, muitas vezes nem queríamos que os nossos filhos fossem iguais a nós, simplesmente já fizeram o mesmo connosco e não conseguimos sair desse registo. No fundo, todos os pais que amam os filhos querem que eles sejam melhores e diferentes, que aproveitem os novos desafios e as oportunidades de cada tempo; do seu tempo de vida, por isso, cabe aos pais perceber o que se passa quando têm esse nível de exigência infundado, pois certamente que estão a reproduzir um modelo de educação que também receberam e contra o qual lutaram.
 
Fátima Fernandes