Família

Pais confundem proteção com afeto

 
A maioria das famílias superprotetoras tem poucos comportamentos amorosos com os filhos.

Na posição dos especialistas, tal acontece porque se confunde o ato de proteger e de querer o melhor para os mais novos com a disponibilidade afetiva «que é basilar para um desenvolvimento sadio e para uma vida adulta de melhor qualidade».
 
Os tempos mudaram e, efetivamente somos melhores pais hoje do que se era no passado, no entanto, «a questão emocional que é tão relevante continua a ser descurada em muitas famílias», sublinham os entendidos.
 
Muitos progenitores apostam numa base educativa de hipervigilância, de controle, de tentativas sucessivas de saber tudo o que os filhos fazem durante o dia, compram-lhes bons brinquedos e acessórios que ilustram riqueza, mas assumem uma postura fria e calculista no que respeita aos sentimentos e às reais necessidades afetivas das crianças e jovens.
 
A grande necessidade que os pais sentem em assumir uma posição de autoridade e respeito na vida dos filhos, não tem dado espaço para que o mundo emocional se desenvolva com qualidade. É quase como se o mais importante fosse garantir que os mais novos seguem uma determinada linha de orientação, comportando-se “bem”, sendo um bom exemplo para a sociedade, obtendo bons resultados escolares e os elogios dos professores e demais atores sociais, mas não construam um mundo emocional à altura de se sentirem livres e felizes.
 
Essa carência afetiva, funciona como uma forma de repressão emocional que inibe a autonomia e reprime as emoções, não dando espaço a que as crianças e jovens expressem o que sentem, que assumam as suas dificuldades e medos e que se preparem para a vida adulta.
 
Tal ocorre devido à herança de gerações em que não era habitual permitir que a criança manifestasse os seus medos, dúvidas, necessidades afetivas, sem esquecer que, os gestos também eram muito condicionados, não sendo fácil beijar e abraçar os filhos.
 
Nos tempos atuais, muitas famílias introduziram a superproteção e as expectativas elevadas em relação ao percurso dos mais novos, mas continua a existir uma enorme lacuna em relação ao plano emocional.
 
Como consequência, as crianças criadas num ambiente superprotetor ausente de afeto, acabam por também sofrer de maus-tratos sejam eles físicos e/ou emocionais, na medida em que, o seu ambiente não lhes fornece reforços, carinho e baseia a sua conduta numa fuga da realidade, sem espaço para que se expressem tal como são e com o que sentem. O seu comportamento reflete precisamente essa carência e, em muitos casos, uma relação fria com os pais e com a própria vida. Nestas famílias, o amor é sofrido e não sentido porque não há espaço para que o mesmo se expresse, partilhe e consolide. Os  pais sentem tanto medo de falhar nos seus objetivos e na sua postura firme e exigente que se esquecem do quanto os mais novos precisam de amor, carinho, compreensão e diálogo.
 
Note-se que, em muitos casos, estes progenitores não agridem os filhos fisicamente, procuram até dar-lhes bons exemplos e orientações comportamentais, mas falham porque não os tratam como pessoas únicas e especiais, com as suas necessidades afetivas, já que o plano emocional é praticamente descurado.
 
Podem dar um beijo de despedida antes de a criança ir para a escola, fazer um gesto carinhoso em sociedade ou quando a criança está doente, mas não ultrapassam essa barreira, porque também já foi assim no seu tempo e porque o mais importante, em seu entender, é só que os filhos sejam bons cidadãos, bem comportados e bem educados.
 
Estes pais acreditam que, ao protegem os filhos dos perigos, estão a evitar que estes se sintam inseguros e a mostrar-lhes  que são um porto-seguro, mas na prática, isso não funciona assim.
 
A superproteção parental está associada à depressão e à falta de determinação dos filhos, na medida em que não lhes dá espaço para que façam as suas próprias descobertas, ao mesmo tempo em que não os apoia nos momentos mais difíceis, o que também não dá muito azo a que arrisquem pelo medo das consequências e por saberem que, os pais os protegem fisicamente, mas nada lhes dão em termos de conforto.
 
Resumem os especialistas que, o afeto parental tem como principal propósito ajudar a criança a alcançar o sucesso. O filho que é amado pelos pais e que recebe essas expressões diárias, cresce com muito mais autoconfiança, autoestima, bem-estar e felicidade. É muito mais desperto para as relações com os outros, é mais criativo, disponível, interessado, capaz de enfrentar a vida e bem sucedido.
 
Assim, muito mais do que se apostar num objeto, na melhor atividade para frequentar, no melhor centro de explicações ou no presente mais caro, os pais devem aceitar que, o amor é a base de um desenvolvimento estável e sadio, devem dar tempo aos filhos para que possam conversar, brincar, trocar ideias, fazer atividades em conjunto e permitir que as crianças se conheçam, ao mesmo tempo em que descobrem o mundo.
 
Os nossos filhos precisam de conhecer a vida real para que se possam defender, necessitam de relações com os outros, de conflitos, de frustrações, de medos e de segurança. Precisam de tudo para saberem distinguir “o certo do errado”, “o bem e o mal”.
 
Naturalmente que temos de os proteger daquilo que eles não são capazes de fazer sozinhos, mas temos de lhes dar uma margem para que descubram a vida pelo seu próprio pé e inteligência. Tal consegue-se dando-lhes confiança, compreensão e um espaço onde eles possam abraçar os pais e sentir que, efetivamente, estes são o seu porto-seguro, logo podem arriscar algo novo.
 
Temos ainda de lhes dar um tempo onde eles sintam que podem falhar e voltar a fazer porque os pais os ensinam e incentivam, errar porque o erro pode ser corrigido e é uma oportunidade para aprender e também evitar certos comportamentos porque se conhecem as reais consequências e se é capaz de avaliar os perigos.
 
Fátima Fernandes