Sociedade

Temos de ser “mais competentes” enquanto pessoas

 
Certamente que me dirá de imediato que faz o seu melhor em termos profissionais e que se preocupa diariamente em mostrar a imagem que esperam de si.

Esse é um tipo de competência que se afasta daquilo que pretendo dizer com esta afirmação de que precisamos de ser mais competentes enquanto pessoas.
 
Refiro-me a uma competência pessoal que ultrapassa aquilo que os outros esperam de nós e que se projeta dentro do nosso “eu” interior. Falo da consciência das suas capacidades enquanto ser humano que o distinguem e que o tornam Pessoa. Falo na capacidade que tem de pensar em liberdade e de encontrar os seus próprios recursos para ser mais assumido e feliz.
 
Refiro-me também ao nosso potencial, mas que temos medo de colocar em evidência, como sendo a inteligência ao serviço do que o nosso “eu” nos pede; a capacidade de descodificarmos o que sentimos dentro de nós.
 
Falo acerca da capacidade de se posicionar neste tempo presente e de analisar a sua vida e aquilo que lhe faz ou não sentido. Refiro-me à capacidade de olhar para si sem máscaras e de ver a sua “verdade” interior. Estou a referir-me também à sua tomada de posição face à sua própria vida e ao seu relacionamento. De forma alguma refiro-me ao “faz de conta” em que muitas pessoas vivem para evitarem ver a realidade. Faço exatamente o desafio oposto, peço que olhe claramente para o que tem e para aquilo que queria ter. Depois, que pondere como é que consegue chegar ao que queria e o que o impede.
 
Quero dizer com isto que, há uma parte de nós que vive em função do que a sociedade espera e outra que vive a frustração de não conseguir libertar aquilo que é e que pretende ser, mas digo-lhe que, é precisamente nessa “parte” que reside a sua verdadeira identidade.
 
Estamos em conformidade com o que somos e sentimos quando conseguimos libertar aquilo que queremos e de que gostamos e, deixamos de nos preocupar com o que esperam de nós. A nossa competência enquanto pessoas reside aí. É nessa aceitação pessoal que estão os bons pais e as boas mães, as pessoas assumidas, resolvidas e felizes, os bons profissionais, os bons especialistas, os bons maridos e as boas esposas, os melhores companheiros de vida.
 
É como se quando nascemos ficássemos reféns daquilo que a sociedade nos incute e exige e, à medida em que vamos amadurecendo vamos libertando e percebendo quem realmente somos, sem essas pressões e expectativas sobre nós.
 
É como se por algum tempo, nos tivéssemos de afastar de toda a carga que nos é transmitida social e familiarmente, para podermos dar espaço à leitura daquilo que temos inscrito dentro de nós.
 
É o personagem de um filme e a pessoa na vida real e, quanto mais aceitarmos que somos muito diferentes daquilo que julgávamos, mais livres e felizes seremos, pois estamos a agir em vez de esperarmos que vivam a nossa vida por nós. Deixamos de usar uma procuração para nos representar e passamos a mostrar a nossa verdadeira identidade, aquela que se resume no cartão de cidadão para a sociedade, mas que é uma cédula pessoal dentro de casa.
 
À medida em que vamos deixando de representar papéis, vamo-nos libertando das máscaras; desses pesos que nos angustiam e deprimem. No fundo, entramos em depressão porque estamos sempre a lutar contra uma pessoa ativa e feliz que não é aceite pela sociedade. Estamos sempre a atrofiar essa nossa essência pelo medo da rejeição e acabamos por nos rejeitar a nós mesmos.
 
Entregamos o nosso casamento ao outro, como se sozinho alguém tivesse o direito de decidir por nós, deixamos que o patrão nos diga o que é preciso fazer porque não temos iniciativa para perceber o que é esperado de nós, entregamos a educação dos nossos filhos à escola e aos avós, como se não fossemos capazes de coordenar bem a nossa vida e dar resposta a essa responsabilidade e, o tempo vai passando e a angústia crescendo.
 
Quando digo que temos de ser mais competentes é isso mesmo: é começar hoje a assumir a nossa responsabilidade perante nós mesmos e a vida. É sermos capazes de dizermos a nós mesmos quem somos, aquilo de que gostamos e queremos sem medo que os outros nos julguem ou digam o que pensam sobre nós. Quando sabemos quem realmente somos e o que queremos, tudo se torna mais claro e fácil.
 
Sabemos o que fazemos num relacionamento, o valor da nossa profissão, a importância que temos na educação dos nossos filhos, o que somos capazes de desenvolver nas mais variadas situações em que participamos. Este é o lado da nossa consciência pessoal, aquele que nos diferencia dos outros e que nos permite assumir tal como somos.
 
É sair de casa como nos apetece e ser apenas cívico e educado, pois os sentimentos são da nossa inteira responsabilidade.
 
É conhecer as regras de boa convivência social, mas desfrutar do prazer de estar com quem nos faz sentido. É saber a razão de procurar uma pessoa em vez de outra, é sabermos por que preferimos um local a outro, é conhecermo-nos de tal forma que somos capazes de argumentar a razão pela qual lemos um livro em vez de estarmos ligados às redes sociais. É sermos capazes de respeitar as escolhas dos outros porque somos capazes de validar o respeito por nós próprios.
 
Isto é liberdade em troca dela. É não nos preocuparmos com a vida alheia, mas sabermos que aprendemos com os exemplos dos outros, por isso estamos atentos ao que se passa à nossa volta.
 
Penso que, quando conseguimos aceitar-nos, assumir-nos e respeitar-nos, não nos preocupamos com as diferenças dos outros e somos capazes de respeitar cada um na sua posição.
 
Para sermos mais competentes, temos de ser mais conscientes e assumirmos o que sabemos. Não podemos passar a vida a fazer-nos de tolinhos só por que somos melhor aceites dizendo que não sabemos o que se passa à nossa volta.
 
Sabemos, mas não queremos fazer o mesmo. Conhecemos, mas não gostamos. Gostamos e assumimo-nos tal como somos! Esta é a base para tudo na vida, sobretudo para se sentir bem consigo mesmo e cada vez mais feliz, amado e respeitado.
 
Fátima Fernandes