Comportamentos

As novas tecnologias alimentam novas formas de posse e ciúme. Porquê?

 
Antes de mais, importa assumir que o ciúme é algo inerente ao próprio ser humano. Temos ciúmes dos nossos pais, dos nossos irmãos e, mais tarde do nosso parceiro ou parceira, no entanto, existem vários níveis de ciúmes e esses sim, constituem um problema quando passam do Normal, para o Neurótico ou Paranóico.

É um facto que, se trata de um sentimento egoísta onde a pessoa que está acometida desse mal se sente incapaz de obter a atenção da pessoa amada, pelo que,  o ciúme normal é aquele que ocorre quando a pessoa amada dá um motivo para o parceiro sentir ciúmes. O neurótico é aquele cujo sentimento de angústia é permanente. Aqui o ciumento tem consciência de que o seu ciúme é exagerado, mas não se consegue controlar. E o terceiro caso, onde é visto como o mais grave e de maior preocupação, pois é aquele onde o indivíduo fantasia uma possível traição podendo ser agressivo e até mesmo cometer insanidades contra o parceiro, sendo necessário recorrer a tratamento psicológico ou psiquiátrico.
 
Se recordarmos como eram os namoros no passado recente sem as tecnologias, certamente que encontramos cenários como encontros diários na escola ou em locais marcados, o uso pontual do telefone e o envio de uma carta para quando a distância era maior. Nesse sentido, percebemos que havia tempo e espaço para sentir saudades, para sonhar com o outro e para esperar que a pessoa amada aparecesse e nos surpreendesse de alguma forma. Nos dias de hoje, com a facilidade com se enviam mensagens, nos ligamos às redes sociais, telefonamos e encontramos as formas mais rápidas e instantâneas de comunicar e de obter uma resposta imediata, percebemos que não damos nem tempo nem espaço ao outro e, muito menos reservamos para nós mesmos essa margem de conforto e de liberdade. Sem nos darmos conta, o outro está sempre ligado a nós de alguma forma, nem que seja por um “like” que colocou numa amiga na rede social sem que o tivesse feito na nossa foto. Mandou uma mensagem para o colega e não teve tempo de responder à nossa, o que dá lugar a muitas cobranças e a um grande sufoco, pois rapidamente se cria um cenário de ciúmes, é fácil desconfiar, duvidar e fazer uma cena. Qual será o benefício disso? Ter de assumir que este modelo de relação não nos satisfaz, não nos permite que estejamos com o outro de livre vontade e quando assim o desejamos. Parece que temos de estar sempre unidos e ligados um ao outro para que o amor sobreviva, quando na realidade é isso que o destrói.
 
Todos precisamos do nosso tempo e do nosso espaço até para pensar no valor do outro na nossa vida, pelo que, não é de admirar que, apesar da facilidade e rapidez com que podemos comunicar, muitas pessoas desliguem os aparelhos. Fazem-no porque precisam do seu próprio espaço, do seu tempo, do seu encontro pessoal e de perceber qual é o valor do outro na sua vida.
 
Quer isto dizer que, temos de aprender a gerir a importância das tecnologias na nossa vida e assumir que, se não o fizermos, seremos “marionetas” do sistema de mensagens, de dizer só para agradar ao outro, muitas vezes sem que isso seja do nosso agrado. Respondemos muitas vezes só para silenciar quem nos impõe uma mensagem à hora do almoço como “prova de amor”, mas nada sentimos com esse gesto forçado, por isso, temos de perceber que, uma pessoa que quer à força manter esse alimento sob posse e pressão, sente-se muito insegura nas suas capacidades e qualidades afetivas, não quer dar espaço ao outro com medo que ele a abandone e daí por diante.
 
Naturalmente que não podemos alimentar isso, mas essa é a nova barreira que temos ao amor na atualidade e, por essa razão, devemos pensar mais seriamente no assunto. Devemos disciplinar o uso das tecnologias na nossa vida e perceber que, se não o fizermos seremos escravos delas e faremos os nossos sentimentos cada vez mais fúteis e insignificantes. Ao mesmo tempo, temos de ajudar os nossos filhos ao correto uso das tecnologias desde cedo para que não sejam eles alvo de relações superficiais, sob posse, ciúme e, no fundo, doentias.
 
Optar pelo encontro presencial é sempre a melhor opção. Quando não se pode estar em presença, manda-se “um sinal” virtual como alimento da relação.
 
Se repararmos, a violência no namoro está a aumentar numa altura em que seria mais fácil os parceiros se manterem em contacto, mas tal não acontece porque o excesso de proximidade das tecnologias aumenta os níveis de ansiedade e de ciúme. A espera da resposta, “estava ligada ao chat, mas não me respondeu”, colocou um “like” na foto do amigo, mas não me disse nada”, são pretextos para uma cena de ciúmes, para a desconfiança, para uma discussão, para terminar um namoro e gerar muito mau-estar entre as pessoas.
 
Se as tecnologias surgiram para nos facilitar a vida, qual a razão pela qual as usamos de forma incorreta e prejudicial? Eis a reflexão que lhe deixamos hoje…
 
Fátima Fernandes