Comportamentos

Até que ponto os videojogos geram comportamentos violentos?

Um jogo pode ter um determinado impacto no comportamento de uma criança ou jovem, mediante os seus antecedentes.
Um jogo pode ter um determinado impacto no comportamento de uma criança ou jovem, mediante os seus antecedentes.  
Foto - Freepik
É comum associar-se os comportamentos violentos das crianças e jovens ao uso de videojogos, no entanto, os cientistas apresentam alguns pontos que merecem uma reflexão.

Tendo por base alguns trabalhos levados a cabo pelos investigadores, «antes de afirmarmos que os jogos violentos naturalmente tornam as crianças e jovens mais agressivos, devemos analisar o contexto em que o indivíduo está inserido para melhor compreender se existe ou não uma relação sólida entre o comportamento e o uso desses equipamentos».
 
Muitos entendidos nesta matéria registam que, nos últimos trabalhos efetuados, foi apenas tido em conta o facto de as crianças ou jovens usarem os videojogos e, em muitos casos, por longos períodos de tempo. Não foi analisado o ambiente familiar em que os jogadores estavam inseridos, «mas isso é um ponto crucial, pois muito mais do que um jogo desencadear um comportamento agressivo, está o facto de o utilizador viver num ambiente onde se aplicam várias formas de violência», registam.
 
Um jogo pode ter um determinado impacto no comportamento de uma criança ou jovem, mediante os seus antecedentes, sublinham os entendidos registando que, uma criança que parta um objeto depois de estar ligada durante algum tempo a um jogo violento, não traduz que o videojogo a tenha motivado para a agressão, mas sim que está habituada a lidar dessa forma com a frustração.
 
Segundo uma resolução da American Psychological Association (APA) de 2015, “não há evidências científicas suficientes para corroborar um nexo de causalidade entre os videojogos e um comportamento violento”. Pode dizer-se que o consumo de jogos violentos pode levar ao aumento da agressividade e do comportamento violento, no entanto,  não existe uma relação direta de causa e efeito, já que outros fatores como o ambiente ou o histórico de violência familiar têm de ser tidos em consideração, lê-se no mesmo documento.
 
“A violência é um problema social complicado que decorre de muitos fatores que merecem a atenção dos investigadores ”, disse a presidente da APA, Sandra L. Shullmam. “Atribuir violência aos videojogos não é cientificamente correto”.  Essa afirmação apenas  “desvia a atenção de outros fatores, como o histórico de violência”, sublinha.
 
Em primeiro lugar, convém estabelecer o que se entende por violência nos videojogos. «É claro que jogos de guerra e tiroteio, como o Call of Duty, têm uma inegável componente violenta, tal como outros jogos mais abertos, da saga GTA, nos quais são reproduzidos comportamentos racistas, sexo explícito ou outros conteúdos que deveriam estar associados a um controle de idade real», explica a mesma responsável.
 
Um outro ponto a ter em conta quando se faz esta análise, é o fator competição que está muito presente nos videojogos e que, segundo os investigadores, jogos como FIFA ou Rocket League podem não oferecer conteúdo violento, mas o simples facto de possuírem muita competição também pode influenciar o aparecimento de certos comportamentos agressivos.
 
A própria decisão da APA reconhece que existem ligações entre jogos violentos e “resultados agressivos como gritos e empurrões”. No caso de jogos que não contenham violência explícita, esses comportamentos podem ser tão compreensíveis quanto aqueles que podem ocorrer após, por exemplo, uma partida de futebol. Existe uma relação entre certos jogos e esses comportamentos, mas não o suficiente para estabelecer uma relação direta de causa e efeito, sublinham os investigadores.
 
Na tentativa de explicar o que faz desencadear os comportamentos violentos dos jovens, os especialistas explicam que, a competição inerente a muitos videojogos são um fator a considerar tal como o ambiente envolvente ao jovem, seja em casa, seja também na escola ou no grupo de amigos, o que, no seu todo, pode dar lugar a comportamentos agressivos.
 
Em jeito de conclusão, a maioria dos estudos não faz uma relação clara entre o uso de videojogos e o aumento ou a presença de comportamentos violentos nas crianças e jovens, no entanto, alertam para comportamentos mais ansiosos, menos paciência, perturbações no sono, em muitos casos, sem esquecer irritabilidade, mais cansaço e menos concentração. Alertam ainda para que se regulamente o tempo de exposição dos mais novos aos videojogos e para a componente viciante dos mesmos, no entanto, a violência, pelo menos de forma direta, parece escapar  às malhas dos investigadores.
 
No debate sobre a influência dos videojogos nos comportamentos violentos das crianças e jovens, os investigadores refletiram também sobre o facto de os utilizadores escolherem de forma apropriada e de acordo com a sua idade, os conteúdos dos jogos, sob pena de estarem a tentar superar uma etapa que se torna muito complexa e com um enorme grau de dificuldade, o que resulta em frustração e mal-estar.
 
Os especialistas recomendam a utilização adequada dos videojogos, num tempo também ele estabelecido e lembram os benefícios desses jogos em termos cognitivos, desde que ajustados, regulamentados e vigiados pelos adultos.
 
Fátima Fernandes