Sociedade

Cada pessoa tem de assumir o comando da sua vida

 
Viver é muito mais do que ter de pedir autorização para viver.

 
A partir do momento em que cada indivíduo chega ao mundo tem pela frente o desafio de se tornar pessoa, de ser igual a si próprio aprendendo com os outros. Chegamos ao mundo através dos nossos progenitores, é deles que recebemos as primeiras influências e cuidados para depois passarmos a receber mais orientações do meio social; das instituições de ensino, das atividades em que participamos e das pessoas com quem nos relacionamos. Somos o produto de todas essas aprendizagens e, em cada etapa vamos resumindo aquilo que se enquadra com os nossos valores de base e, descartando aquilo que se afasta do que aprendemos.
 
Mais tarde, por volta dos 21 anos, altura em que realmente temos o nosso processo de formação pessoal completo, temos de começar a selecionar por entre aquilo que aprendemos. É desse conflito que resulta aquilo que realmente somos. Uma parte é seguramente produto da nossa infância, outra é produto da nossa aprendizagem com os outros e ainda outra é o resultado das nossas escolhas e daquilo que fomos descartando e aceitando nas etapas anteriores. Quer isto dizer que, apesar da forma simples com que apresento o processo de formação pessoal que, nascemos para nos tornar pessoas, para sermos nós próprios, para sabermos aquilo que queremos e com quem queremos conviver. Há alturas em que nos deixamos influenciar pelos outros, mas assim que nos sentimos mais seguros, temos uma natural tendência para querermos fazer as coisas á nossa maneira.
 
A sensação de ter o comando da nossa vida é algo que nasce connosco e que está associado á nossa autonomia, capacidade de pensar e de analisar e até a nossa forma de vincarmos quem somos. Quando os pais respeitam o processo, os filhos vão aprendendo a ser eles mesmos nas diferentes etapas do seu desenvolvimento e acatam as suas orientações para depois as colocarem em causa e ajustarem aos seus interesses e preferências. Quando os pais não fornecem essa liberdade e autonomia, naturalmente que os filhos vão ter de se afirmar à força. É daí que resultam os maiores conflitos entre pais e filhos, pois essa falta de espaço e de liberdade acaba por não permitir que a relação se processe com normalidade. É importante perceber que, os pais dão liberdade à medida em que percebem que os filhos conhecem os valores, normas e regras da sociedade e cultura onde estão inseridos. Os pais não podem dar liberdade de escolha a uma criança que não se sabe proteger dos perigos, mas podem deixá-la escolher uma brincadeira, uma história. Quer isto dizer que, a liberdade e a autonomia têm de ser ajustadas a cada idade e os filhos precisam de compreender isso.
 
Perante isto é essencial perceber que, quem quer ter uma boa relação com os seus filhos tem de lhes permitir fazer as suas escolhas. Tem de lhes dar essa liberdade e oportunidade de crescerem e de se desenvolverem, no entanto, há muitos pais que não o fazem e acabam por viver um autêntico “braço de ferro” com os filhos, pois sem a maturidade necessária, os mais novos acabam por “bater o pé” em busca dessa liberdade cometendo muitos erros desnecessários. Seria mais simples perceber que os pais não são donos dos filhos e que, os filhos adultos têm o direito de fazer o que quiserem com os valores que aprenderam em crianças.
 
Por exemplo, os pais católicos normalmente desejam que os filhos se casem pela igreja. Terão os pais esse direito de exigir aos filhos o seu casamento de sonho quando não o é para os mais novos? O mesmo se passa com a escolha da profissão, dos namoricos, das amizades e daí por diante. Os pais têm de se colocar no seu lugar e compreender que deram o direito à vida de um novo ser, não lhe deram obediência e escravatura para toda a vida. Os pais ensinam os valores, os filhos aprendem essas orientações, mas na idade adulta decidem o que querem fazer com esse conhecimento e qual a melhor forma de se posicionarem no mundo.
 
Por outro lado, os filhos também têm de saber afirmar a sua vontade e a sua liberdade. Os pais ajudam, mas têm de ser eles a fazer o seu caminho. Não faz sentido que, com 18 anos sejam os pais a decidir com quem o jovem vai à praia ou a uma festa. O filho deve saber quem são as melhores companhias para si. Não é a mãe que escolhe a roupa do filho, quem lhe diz com quem deve sair e para onde deve ir. Se a educação correu bem, o filho saberá muito bem resolver os seus problemas, as suas amizades, saber quem são as melhores companhias para si e que, se beber, não pode conduzir. Esta responsabilidade tem de ser transmitida desde cedo. Se os pais fazem tudo pelos filhos, se quase vivem a vida dos filhos, como é que os libertam para esta autonomia e capacidade de pensar e de prever os perigos?
 
Na realidade, penso que temos de reformular os papéis. Os pais têm de saber muito bem que regras dão aos filhos e quais os resultados que daí vão surgir. Os filhos devem acatar essas regras e fazer o seu trabalho de casa. Pensar acerca do que os pais lhe dizem e, quando tem dúvidas, perguntar. Ler, tentar informar-se para saber mais por exemplo acerca dos perigos da internet, do consumo de álcool ou drogas, bem como a importância de praticar sexo protegido. Muitas vezes os pais não estão à altura de proteger os filhos dessa realidade, pelo que, desde cedo, os mais novos têm de estar atentos para os muitos perigos existentes em algo que parece inofensivo, mas que não é. Por outro lado, os pais têm de perceber que, colocar um filho no mundo é um ato de responsabilidade, pelo que devem procurar saber mais para alertar os filhos do máximo de perigos que correm.
 
Tenhamos em mente que, educar é um processo conjunto. O sucesso da educação depende da capacidade de envolvimento de pais e filhos. Os pais envolvem os filhos ao mesmo tempo em que lhes dão responsabilidades e o comando das suas vidas. Os filhos sabem que podem contar com o apoio dos pais, mas que têm de aprender a assumir as suas escolhas e as suas responsabilidades. Com bons resultados, pais e filhos serão amigos para a vida, pois percebem que, em vez de perderem tempo com tricas inúteis, com conflitos estúpidos, ambos se envolvem no mesmo processo. É muito importante que os filhos sintam que os pais os amam e que fazem e ensinam o melhor. Esta marca de confiança fica para a vida e, prepara os mais novos para irem ao encontro dos valores dos pais e não se colocarem “no contra” para chamar a atenção e provocar. Precisamos de um processo educativo mais pacífico para que seja bem-sucedido, por isso, dê a autonomia necessária ao seu filho em cada etapa de desenvolvimento e alerte-o para os perigos e benefícios. Os filhos aceitam essa autonomia e pedem apoio quando não sabem o que fazer. Isto é amor, isto é ser pai e mãe.
 
Fátima Fernandes