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Como a frustração ajuda a crescer

Como a frustração ajuda a crescer
Como a frustração ajuda a crescer  
Foto Freepik
No passado, os pais frustravam excessivamente os filhos com tantos “não”. Hoje, não deixam que a frustração exista com tantos “sim”. Os especialistas explicam onde está o eqilíbrio.

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São inúmeros os estudos e artigos científicos que demonstram o quanto a frustração tem um papel determinante para o desenvolvimento e, como o excesso de frustrações também limita o desenvolvimento saudável. Para entender esta dualidade, importa refletir sobre o que mudou nas nossas vidas e na forma de educar da generalidade dos pais.

Como estavam também habituados a ouvir “o não” dos seus pais, os adultos de hoje optaram por dizer apenas “sim” para evitar o sofrimento dos filhos. A acrescentar a este facto, as tecnologias trouxeram-nos a noção de imediatismo que, noutros tempos também não existia. Resumindo: esta combinação, segundo os especialistas, está a dar lugar a uma geração de crianças que não conseguem tolerar a frustração, que se irritam sempre que são contrariadas, que querem tudo e à sua maneira. Para além de ser muito difícil educar estes miúdos, também estamos a comprometer-lhes o futuro, já que não os estamos a preparar para a realidade do nosso mundo.

Vale a pena perguntar: algum de nós cresceu sem que lhe tenham recusado algo? Alguém acredita que é possível viver sem contrariedades? Algum pai ou mãe acredita que os filhos vão ter tudo no imediato e que não lhes vai faltar nada?

Certamente que todos sabemos a resposta, pelo que é importante reagir o mais rapidamente possível, sob pena de estarmos a criar uma geração de adultos desajustados, infelizes e incapazes de lidar com a frustração.

Não nos podemos esquecer de que, a frustração faz parte da própria vida, ajuda-nos a pensar, a encontrar soluções para os problemas e até a sermos criativos, razão pela qual  é indispensável que ensinemos os nossos filhos a esperar, a lidar com um “não sei”, “vamos ver”, “não gostas muito, mas é importante fazer porque…” , “agora não é tempo de telemóvel”, “vamos estudar”, “ajuda-me a arrumar as compras”, entre outros.

Os especialistas sublinham a importância de educar pela positiva, sim. Ensinar, conversar, explicar, mas também permitir que a criança saiba o que é não estar entretida e tenha de procurar algo para fazer longe dos ecrãs. Evidenciam também o quanto é essencial ouvir os filhos em vez de lhes entregar tecnologia para que se ocupem às refeições em casa e no restaurante, que os pais saibam dosear também o uso que fazem das tecnologias para que transmitam esse exemplo aos filhos, sob pena de ninguém assumir a autoridade dentro de casa, ninguém ouvir ou dizer “um não” ou um “espera um pouco”, “faz outra coisa” ou algo semelhante.

Na prática, os pais estão no restaurante com amigos e devem dar oportunidade para que os filhos, mesmo os mais pequenos, participem em algumas conversas. Depois disso, podem entregar o ecrã 15 minutos aos miúdos para que eles possam conversar entre adultos. É tudo uma questão de gerir as atenções, de dar com regras, conta, peso e medida. Desse modo, as crianças aprendem a conviver, a estar à mesa e a utilizar as tecnologias num tempo mais reduzido e equilibrado com as demais tarefas. Ao fazermos esta técnica com tudo, certamente que os mais novos vão conhecer o mundo de outra forma; de um modo mais realista onde há lugar para tudo e não somente para o mundo digital, alertam os especialistas na área da psicologia e da pediatria.

— O adulto que tem o culto do imediatismo, em vez de ser uma pessoa controlada, tem dificuldade em aceitar as situações e inserir-se no mundo.

Pressionados a responder às demandas dos filhos imediatamente, os pais acabam por responder impensadamente. A consequência, é a criação de jovens pouco preparados para lidar com a vida – segundo a coach Ana Raia.

A mesma especialista acredita que, a tecnologia contribui para o imediatismo, uma vez que, ao toque de um dedo no ecrã,  qualquer informação pode ser obtida em pouquíssimos segundos. Temos o mundo dentro da nossa casa, dentro da nossa carteira, dos nossos bolsos.

Não conseguimos sustentar uma dúvida por muito tempo, um incómodo, uma pulga atrás da orelha. Não sabemos lidar com um mal-estar num mundo onde a felicidade é imperativa.

E a dúvida, explica Rosely Sayão, é preciosa. Tal como a espera e o pensamento porque ajudam a criança a crescer e a amadurecer. Crianças que não têm momentos de “mente vazia”, por exemplo, poderão sofrer graves consequências na vida adulta.

Alguém que está sempre entretido terá para sempre a necessidade de entretenimento constante, alerta o médico Daniel Becker, criador do projeto Pediatria Integral.

Para ser criativo, o cérebro humano precisa da criatividade.

— São necessários momentos de envolvimento, em que os mais novos podem comprometer-se, dar e receber, aprender com as experiências e momentos  de ócio em estado de contemplação. Quando uma criança tem o seu tempo completamente controlado com atividades como escola, inglês, natação, Facebook, Instagram, WhatsApp, etc, acaba por ficar incapacitada de desenvolver processos interiores profundos e importantes para o seu desenvolvimento e equilíbrio geral, alerta o mesmo pediatra.

Becker acrescenta que crianças que não interagem com os seus pares ou mesmo com adultos porque passam o dia com ecrãs na mão, desenvolverão menos inteligência emocional, empatia e capacidade de comunicação quando crescerem.

Para Rosely Sayão, dar um gadget à criança em momentos onde seria suposto socializar com a família e os amigos, não é um carinho, mas sim, um comodismo.

Para finalizar um assunto que só deveria estar a começar e,  com uma mudança de atitude, o pediatra Daniel Becker reforça que, o primeiro passo é mudar a mentalidade dos pais para que esse exemplo se reflita nos filhos, pelo que, estabelecer regras para todos é o caminho para uma família mais saudável, filhos mais criativos, afáveis, empáticos e com um futuro promissor. Todos ganham saúde com estas orientações, acredite.

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