Sociedade

Convenção sobre os Direitos da Criança recordada em Lagos

 
Foi ontem descerrado, no átrio principal do Ed. Paços do Concelho Séc. XXI, um mural e placa alusivos aos 30 anos da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança.

O momento foi protagonizado por Hugo Pereira (Presidente da Câmara), Álvaro Laborinho Lúcio (Juiz Conselheiro Jubilado, ex-ministro da Justiça e escritor), Ana Fazenda (representante na região da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção de Crianças e Jovens), Francisco Gaspar (Presidente da CPCJ de Lagos), Carlos Rodrigues (Procurador da República – Tribunal de Família e Menores de Portimão), diretores dos agrupamentos de escolas de Lagos (Gil Eanes e Júlio Dantas) e demais entidades que participaram na palestra, intitulada “Os Direitos da Criança – Uma Cultura, uma Responsabilidade (A Família, a Escola e a Comunidade)”. 
 
Conforme acrescenta nota do Município, a iniciativa que aconteceu no auditório do edifício da Câmara Municipal de Lagos, encheu-se «de docentes, educadores, técnicos da área social e autarcas». Álvaro Laborinho Lúcio, especialista em matéria de direitos da criança, estruturou o seu discurso, durante quase duas horas, transmitindo o seu «profundo conhecimento, experiência, humildade e capacidade de comunicação».
 
 
Laborinho Lúcio definiu o que é ser criança no ponto de vista das principais correntes de pensamento, sobre a diferença de conceção subjacente à substituição, no quadro jurídico, do termo “menor” (objeto de direito) pelo termo “criança” (sujeito de direito) e sobre algumas das características e dos direitos da criança enquanto “realidade antropológica anterior ao Direito e portadora de uma cultura própria”, destacando: o direito ao tempo de ser criança; a interatividade das crianças; a fantasia do real; a reiteração; o desejo; a ludicidade (o direito de brincar); o direito à felicidade; o direito à família; o direito à educação; o direito à comunidade; e o direito a um desenvolvimento harmonioso.
 
Interpelado pelo público sobre as questões da adoção, Laborinho Lúcio referiu que o debate público em torno desta temática tem falhado pela forma como as questões são colocadas, relembrando, por exemplo, o debate que ocorreu em torno da adoção de crianças por casais homossexuais, em que a pergunta não deveria ter sido “se um casal homossexual tem direito a adotar a criança”, mas sim “a qual família tem a criança direito”, pois, no seu entender, a família biológica tem que adotar afetiva e emocionalmente a sua criança biológica e, quando tal não acontece, essa criança tem direito a ser adotada por outra família que não a biológica, que cumpra esse papel da adoção afetiva e emocional, independentemente da sua tipologia. 
 
Crítico relativamente ao modelo de escola que temos, e ironizando a situação com a afirmação “temos um modelo de escola fantástico; o que atrapalha são as crianças”, Laborinho Lúcio lembrou que a escola atual é um espaço heterogéneo, pelo que não se pode tratar todos os alunos da mesma forma, havendo que abandonar o modelo dominante, muito associado a questões de eficácia numa lógica de competitividade, para passar a adotar um modelo plural que se preocupe com a formação de cidadãos, livres no pensamento e com capacidade crítica e de adaptação, pois a sociedade tão em constante mutação assim o exige.
 
Recordando a afirmação do filósofo Edgar Morin “Precisamos de tornar a humanidade como comunidade de destino”, Laborinho Lúcio destacou ainda o direito das crianças a serem protegidas pela comunidade, contexto de onde emergem as comissões de proteção de crianças e jovens, sublinhando o importantíssimo papel das comissões alargadas.
 
Nas intervenções de abertura o Presidente da CPCJ de Lagos apresentou a Comissão do ponto de vista do volume e do tipo de processos que anualmente por ela passam, numa média de 260 a 280 processos, maioritariamente relacionados com situações de negligência, de violência doméstica e de absentismo escolar. Por seu turno, Ana Fazenda, referindo-se à Convenção sobre os Direitos da Criança, relembrou que “todos os dias são dias de celebração da Convenção, pois todos os dias devemos fazer os possíveis para que as crianças tenham os seus direitos assegurados”. Carlos Rodrigues, Procurador da República, revelou ter existido uma diminuição de processos em tribunal. Para o Presidente da Câmara “o muito e bom trabalho feito nesta matéria não deve inibir que se continue a fazer ainda mais e melhor”, desafiando a comunidade, escolar e não só, a envolver-se na missão de alcançar a atribuição do Selo Protetor para outras entidades.
 
A forma para lá chegar foi também deixada por Laborinho Lúcio, segundo o qual a palavra de ordem nas áreas de intervenção social deverá ser: “o máximo de dedicação e o máximo de humildade”.