Política

Deputados do PCP questionam Governo sobre recurso "ilegal e abusivo" a estágios nas lojas do Pingo Doce no Algarve

O PCP diz que teve conhecimento, através de uma comunicação interna do Grupo Jerónimo Martins, que este grupo lançou um "programa pioneiro", apelidado de "Academia de Retalho", destinado "a familiares dos colaboradores entre os 18 e os 25 anos que queiram trabalhar" no Algarve, durante o Verão.

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Depois de lidos os requisitos, o PCP diz em comunicado que compreende-se facilmente por que sugerem que lhes sejam recomendadas pessoas a quem seja "reconhecida a Dedicação, a Resiliência, a Responsabilidade e o Compromisso".
 
Segundo o PCP a dita "Academia de Retalho Pingo Doce é um programa que consiste numa experiência em contexto prático numa loja (...) aliada com a participação em 4 workshops sobre o mundo da Distribuição".
 
As condições desta "oportunidade" são "horário rotativo de 2 em 2 semanas: 06h às 16h; 11h às 21h; 23h às 08h"; duas folgas semanais; "bolsa de estágio no valor líquido de 500€"; "Subsídio de Alimentação no valor de 5,40€/diários, em cartão de refeição"; "Alojamento (em quarto partilhado) e refeição extra (apenas para residentes fora da região do Algarve)"; "Transporte de ida e volta para o Algarve, no início e final do programa (apenas para residentes fora da região do Algarve)". 
 
Na mesma nota os comunistas destacam que é referido que "qualquer falta injustificada, falta de pontualidade, incumprimento de normas e procedimentos internos nas instalações da Empresa e/ou do Alojamento, ou algum ato que ponha em causa a imagem do Pingo Doce ou do Grupo Jerónimo Martins, levarão ao abandono imediato do programa sem lugar ao pagamento da Bolsa de Estágio". No final, os trabalhadores podem habilitar-se a um "interrail de 10 dias".
 
Uma situação que para o PCP «é da maior gravidade, com destaque particular para a imposição de um horário de trabalho de 10 horas diárias e 50 semanais».
 
O PCP aponta para o Decreto-Lei n.º 66/2011, de 1 de junho, que estabelece o enquadramento, os termos e as condições da realização de estágios profissionais, excluindo os estágios curriculares, os estágios que tenham uma comparticipação pública e os estágios que sejam pressuposto para o ingresso em funções públicas. Pelo que ao abrigo deste diploma, é obrigatório "definir o período de duração do estágio, a identificação da área em que o estágio se desenvolve e as funções ou tarefas que estão atribuídas ao estagiário, o seu local de realização e os tempos de realização das atividades do estágio".
 
O mesmo diploma define um "estágio profissional" enquanto "formação prática em contexto de trabalho que se destina a complementar e a aperfeiçoar as competências do estagiário, visando a sua inserção ou reconversão para a vida ativa de forma mais célere". Contudo, não parece ser essa a perspetiva deste regime de prestação de trabalho, assinala o PCP.
 
Os estágios são tidos como não podendo ter uma duração superior a doze meses, embora se preveja a possibilidade de estágios de curta duração, inferiores a três meses. De acordo com o artigo 5.º do diploma, é referido que, nesse caso, do "contrato de estágio profissional de muito curta duração devem constar, ainda, de forma fundamentada, os motivos que justificam o seu curto período de duração", o que não surge claro da leitura das condições do estágio oferecido, além de ser no período coincidente com o do Verão.
 
O artigo 6.º refere que "durante o estágio é aplicável o regime do período normal de trabalho, de descansos diário e semanal, de feriados, de faltas e de segurança e saúde no trabalho, aplicável à generalidade dos trabalhadores", pelo que o horário proposto desrespeita claramente este disposto.
 
Quanto à "orientação do estágio", prevê-se que "a entidade promotora do estágio deve designar um orientador de estágio, que não pode acompanhar mais de três estagiários" e que "a orientação do estágio consiste, designadamente, em: a) Elaborar, ouvindo o estagiário, o plano individual de estágio; b) Realizar o acompanhamento técnico e pedagógico do estagiário, supervisionando o seu progresso face aos objetivos fixados no plano individual de estágio; c) Avaliar, no final do estágio, os resultados obtidos pelo estagiário".
 
Nenhuma destas matérias parece encontrar-se salvaguardada, tudo indiciando que as condições desta "oportunidade" configuram uma estratégia de recurso abusivo a estágios para ocupação de postos de trabalho efetivos, "com recurso a salários de miséria e condições indignas de trabalho, alojamento e alimentação", defendem os comunistas.
 
Para o PCP este tipo de práticas, a confirmar-se, configuram «casos da maior gravidade, ainda mais quando praticadas por um grupo económico com robusta saúde financeira, com condições para garantir, no mínimo, o cumprimento da lei e a garantia de condições de trabalho adequadas, cuja administração advoga a necessidade de uma elevada ética na gestão das suas atividades».
 
Assim, o Grupo Parlamentar do PCP, por intermédio dos deputados Rita Rato e Paulo Sá, questionou o Ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, dirigindo-lhe duas questões, se o Governo tem conhecimento e acompanhado este assunto, através do IEFP e da ACT e que medidas urgentes, vai tomar para garantir o cumprimento da lei e dos direitos dos trabalhadores.
 
Algarve Primeiro