Sociedade

Fogo de Monchique afeta ninhos da Ave do Ano 2018

Foto: Leonardo Fernández Lázaro (CC BY-SA 4.0)
Foto: Leonardo Fernández Lázaro (CC BY-SA 4.0)  
O incêndio que continua a lavrar desde sexta-feira em Monchique põe também em perigo a águia-perdigueira (ou águia-de-bonelli), a Ave do Ano 2018.

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Segundo nota da SPEA - Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, a região alberga uma das mais importantes populações da espécie no nosso país, e pelo menos quatro casais poderão ter sido diretamente afetados. 
 
Pelos dados que a SPEA diz ter disponíveis, há pelo menos quatro casais que nidificam na zona que já ardeu, com vários ninhos que poderão ter desaparecido com o fogo. 
 
E há outros casais com territórios próximo, que também podem ter sido afetados ou ainda estar em risco,diz Joaquim Teodósio, coordenador do Departamento de Conservação Terrestre da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Ave. "A serra de Monchique é um dos núcleos populacionais mais importantes para esta espécie em Portugal; as serras de Monchique e do Caldeirão são onde ocorrem os maiores e mais densos núcleos de águias-perdigueiras do país, que são também relevantes a nível ibérico e europeu." 
 
A serra de Monchique está classificada internacionalmente como Área Importante para as Aves e a Biodiversidade, e faz parte da Rede Natura 2000, dada a sua importância para uma variedade de espécies e habitats.
 
Para a águia-perdigueira, esta zona tem sido, a par da serra do Caldeirão, um importante refúgio nos últimos anos. O número de águias-perdigueiras em Portugal diminuiu drasticamente nos anos 80, e apesar desse declínio ter continuado no norte do país – onde na última década a população desta espécie se viu reduzida em 40% - no sul as populações têm-se expandido com tanto sucesso que inverteram a tendência nacional. Parte do segredo desse sucesso poderá ter sido um comportamento que contribui para que estejam agora mais ameaçadas pelo fogo, frisa a SPEA. 
 
"No sul de Portugal, em vez de fazerem os ninhos maioritariamente em escarpas, nas rochas, as águias-perdigueiras preferem nidificar em árvores de grande porte," explica Joaquim Teodósio. "Por isso, há o risco de o fogo destruir não só os ninhos mas também as outras árvores em que estes casais poderiam fazer ninhos novos."
 
"Se forem afetadas áreas importantes dentro dos territórios e houver casais que fiquem sem sítio onde nidificar ou se alimentar, é possível que haja uma reorganização, que os casais tenham que se redistribuir pela floresta e usar o espaço de forma diferente, como vimos acontecer na serra do Caldeirão, depois do incêndio em 2012" diz Rita Ferreira do Grupo de Trabalho em Águia-de-bonelli da SPEA.
 
Para além do impacto direto sobre os ninhos, este incêndio terá certamente causado a morte de perdizes, pombos, coelhos e outras presas de que as águias-perdigueiras dependem, pelo que nos próximos tempos é provável que as águias-perdigueiras enfrentem escassez de alimento. As consequências para a fauna e flora poderão ser significativas num incêndio desta dimensão e a sua recuperação irá depender das espécies e da extensão das populações que são afetadas.
 
"Neste momento, ainda não é possível saber qual vai ser o impacto concreto. Apesar de os fogos serem frequentes neste tipo de habitas, neste caso são áreas incrivelmente extensas onde o fogo está a passar, mas pode ser que nalguns casos não tenha afetado todos os ninhos e outras áreas importantes para estes casais. Só mais tarde, no rescaldo do fogo e com um acompanhamento a longo prazo das aves, é que vamos poder aferir as consequências" conclui Joaquim Teodósio. 
 
Certo é que para além dos terrenos e bens ardidos, as populações de Monchique, Silves e áreas envolventes irão perder também importantes recursos ecológicos, não só pela perda de biodiversidade, mas também, por exemplo, pelo aumento do risco de erosão e consequente perigo de aluimento de terrenos e perda de solo, ou a contaminação de recursos hídricos, avisam os especialistas.