Comportamentos

O amor verdadeiro não aceita dependência

 
Os sentimentos são sempre um plano de vida que motiva muita curiosidade, especialmente porque, em cada tempo de vida, precisamos de atualizar a nossa forma de nos posicionarmos no mundo, nas relações com os outros e acima de tudo, compreendermo-nos melhor e saber o que sentimos.

 
Quando digo que o amor verdadeiro não aceita dependência, é porque ao longo da vida conhecemos diferentes tipos de sentimentos e também diversas formas de amar ou que julgamos ser amor.
 
Um indivíduo nasce no seio de uma família e desenvolve sentimentos pelos pais, aos poucos começa a despertar para outros familiares e, mais tarde para as amizades.
 
Quando vive o primeiro sentimento mais próximo do amor é, muitas vezes, já na idade adulta quando encontra alguém que reúna as características que foi conhecendo em diferentes pessoas. Não é por acaso que se diz que raramente casamos com aquela pessoa que nos despertou para o mundo afetivo na adolescência, uma vez que, não havia uma intenção clara de descobrir o amor, mas sim de nos conhecermos melhor a nós próprios.
 
Na idade adulta, já temos uma maior consciência de nós próprios e, com ela, um maior conhecimento daquilo que procuramos noutra pessoa que nos possa ajudar a devolver aquilo que sentimos.
 
O amor passa por diferentes fases até que se consolide, sendo essencial que nos vamos posicionando naquela que mais se aproxima com aquilo que somos e sentimos.
 
Muitas vezes, experimentamos relações com várias pessoas até que encontremos esse potencial de identificação com o outro. São muitos os casos em que o amor nasce e se desenvolve com a mesma pessoa inicial, o que permite uma maior e mais rápida clarificação do que pretendemos com esse relacionamento.
 
Como estamos sempre a evoluir mentalmente, é natural que o nosso conceito de amor também se altere ao longo dos tempos e que até possamos ver uma mesma pessoa “com outros olhos”.
 
A evolução ocorre em todos os sujeitos, razão pela qual, no seio de uma relação há altos e baixos, momentos de maior ou menor paixão e intensidade, mas perante os confrontos, sabemos que queremos estar com aquela pessoa, mesmo que não consigamos reunir muitas justificações: sentimos esse desejo.
 
À medida em que passamos por todas essas etapas, com a mesma pessoa ou com outra, sentimos que os nossos sentimentos se vão aperfeiçoando e que deixamos de falar em amor como algo abstrato. Sabemos descrever aquilo que sentimos e o que mais gostamos na outra pessoa, sabendo claramente separar as nossas características também. É nesse ponto de amadurecimento que se quebram as dependências.
 
É nessa fase que sabemos aquilo com que podemos contar em nós próprios e, muito melhor aquilo com que contamos com o outro. Amamos em liberdade. Quando parecia que o amor estava a acabar, é quando se constata que o amor nasceu e vingou, pois é quando conseguimos ver o outro de fora e sentir um conjunto de emoções concretas.
 
Já se pensou que o amor só pode ser sentido, mas eu defendo que o amor tem de “ser autorizado” pela nossa mente e corpo para que se consolide, logo não pode manter-se no domínio abstrato, mas sim concreto com direito a sonhos!
 
À medida em que amadurecemos os nossos sentimentos e a forma como vemos o mundo, sabemos muito melhor a importância que a outra pessoa assume na nossa vida e o quanto acrescenta aquilo que temos e somos. Isso é amor!
 
Isso é a vontade de ser feliz ao lado do outro e assumir que, juntos enfrentam muitos mais desafios do que em separado.
 
Assume-se que a companhia é tão importante como a intimidade, assume-se que se está com amigos, mas que se gosta de chegar a casa e estar com aquela pessoa, assume-se e afirma-se que, a nossa vida sem aquela pessoa não faria o mesmo sentido. Esquece-se o medo da perda e tira-se partido do que se tem.
 
Afastamo-nos do que os outros pensam a nosso respeito e assumimos que gostamos de agradar a quem amamos e, tudo faz um sentido diferente para a nossa vida.
 
Nessa fase também nos preocupamos muito menos com pormenores e em ter de agradar ao outro, já que isso passa a ser garantido pelo facto de existir uma boa relação e um bom entendimento no seio do casal. Essas preocupações passam para a criatividade de fazer planos em conjunto e dá-se mais solidez aos sentimentos.
 
Deixa de ser preciso falar tudo porque sabemos que o outro nos entende quase que só por gestos e despertamos para novas emoções no exterior, nomeadamente passeios, convívios, visitas culturais entre outros programas que abarcam os gostos de ambos. Existe um foco em ser feliz.
 
Só o tempo nos permite alcançar este estádio de amor. Antes desta construção, passamos por muitos medos, por uma grande necessidade de nos projetarmos no outro e por nos esquecermos de nós mesmos. Quando encontramos este estado de tranquilidade interior e que se divide com o outro, podemos dizer que encontramos o amor e, sem dependências de qualquer espécie!
 
É nesta fase que percebemos o valor do tempo, a necessidade de fazer mais planos em conjunto e de elogiarmos o outro para que seja cada vez mais feliz. Não existe uma idade para este encontro, existe uma maturidade que se constrói na relação e que precisa de tempo, dedicação e muita compreensão e respeito.
 
No fundo, só encontra o amor quem percebe que, por muitos planos materiais que tenhamos, é o amor que dá sentido à nossa existência. É o sermos capazes de nos assumirmos e mostrarmos a alguém tal como somos e sermos corajosos para ver o outro na sua plenitude sem julgamentos ou preconceitos que, esses sim, causam dependências porque estamos sempre a preparar o nosso cérebro para algo que no fundo, não aceitamos.
 
Amar em liberdade é mesmo usar a libertação no sentido literal da palavra!
 
Fátima Fernandes