Família

Sabe lidar com “os filhos digitais”?

 
Por se tratar de um fenómeno recente, muitos pais assumem as suas dificuldades em lidarem com “os filhos digitais” e, sem saberem muito bem onde podem esclarecer as suas dúvidas, acabam por se fechar em silêncio e em medos que precisam de ser transformados.

 
Antes de mais, importa reconhecer que, as crianças de hoje são muito diferentes das crianças de outros tempos, sobretudo por nascerem num tempo informatizado em que os dedos e a mente parecem ser os órgãos do corpo mais desenvolvidos.
 
Não podemos escapar ao progresso, mas também não podemos ficar de braços cruzados e sem uma posição a adotar face a ele. Continuamos a querer formar indivíduos e a permitir que se tornem pessoas, razão pela qual, os pais e educadores têm de se impor neste processo desenfreado de automação.
 
Estou certa de que começam a surgir as perguntas dos pais à medida em que vão lendo este apontamento, o que é natural e constitui o objetivo central da sua existência, bem como despertar a curiosidade para aprofundar o tema num bom livro.
 
Não podemos permitir que os nossos filhos “só” sejam seres digitais, razão pela qual temos de lhes fornecer outros estímulos e centros de interesse. As crianças e jovens deste tempo, naturalmente que não estão tão predispostas para atividades que as crianças do passado viviam e que as fazia felizes, mas certamente que há alternativas que lhes despertam a curiosidade e interesse se lhes forem apresentadas.
 
Pode-se, ao mesmo tempo, aproveitar as tecnologias para fazer esse trabalho, nomeadamente retirar da internet ideias para brincar ou jogar em vez de utilizar esse recurso só para esse fim.
 
Depois, puxar as crianças e jovens para outras atividades é um imperativo para que se desenvolvam noutras áreas, o problema é que, muitos pais estão também eles fascinados pelas tecnologias e parecem não ter soluções para desfrutar de um tempo de qualidade em família.
 
Só em jeito de curiosidade, dados recentes demonstram que 67% dos jovens portugueses se queixam de falta de atenção dos seus pais, o que revela bem a importância de começar a fazer algo, pois as desculpas de que os filhos “só se interessam pela internet” parecem já não ir ao encontro da realidade dos mais novos.
 
Temos de nos assumir para podermos exigir e melhorar a qualidade de vida de quem não irá descobrir outro mundo para além do tecnológico, se nós não o apresentarmos com valor, interesse e de forma divertida.
 
Muitos pais partem do princípio de que os miúdos já nasceram sem paciência para outra coisa que não a ligação às máquinas e, com essa ideia pré-concebida, acabam por aceitar de forma resignada e revoltada essa condição, mas as máquinas chegam a casa pela mão dos pais e, a forma como são utilizadas também é por eles autorizada.
 
Não se sinta culpabilizado pelo que já fez, transforme essa energia no que pode fazer. O nosso cérebro está a evoluir todos os dias, razão pela qual, em pouco tempo, podemos mudar algo em nós.
 
Ao tomar consciência de um erro, vai encontrar alternativas para o corrigir. O problema é não assumir que é um erro e que se pode melhorar.
 
Faça agora uma organização das tecnologias na vida da família. Em vez de aproveitarem o tempo livre para estarem ligados aos ecrãs, partam do princípio de que isso já é um gesto diário e que se têm é de afastar dos monitores de qualquer espécie.
 
Um passeio de bicicleta, uma caminhada, a leitura de um bom livro em família, onde o diálogo faça parte de todos são boas opções para começar a programar o cérebro noutro sentido.
 
Não abdicar de uma refeição em família sem monitores em cima da mesa é outra chave importante para quem passou o dia todo afastado e aproveita aquele ponto de encontro para conversar, para falar sobre o seu dia e os seus problemas e dúvidas.
 
Bem sabemos que os mais novos imitam os pais, razão pela qual o exemplo se assume com uma relevância extrema. Se todos saírem da mesa ou do sofá para irem jogar à bola, ninguém fica em vantagem. O mesmo se passa com uma boa partida de xadrez ou outro jogo de tabuleiro que possa reunir a família em torno de uma brincadeira.
 
E que tal ir ao cinema ou ao teatro em família? E a um concerto com o artista favorito?
 
Não tem dinheiro para esses eventos porque comprou um smartphone novo? Opte por diversões mais económicas como uma boa caminhada num local agradável, um piquenique num fim de semana de sol, com este bom tempo a chegar. Há seguramente muitos locais que nunca visitaram e outros que merecem ser revisitados. Não tenha dúvida de que, os seus filhos vão adorar ir a um sítio da infância dos pais onde se pode contar uma memória ou até uma piada do que aconteceu. É tudo uma questão de colocar a imaginação a funcionar!
 
O importante é que tenha sempre uma ideia em carteira para afastar os olhos dos seus filhos dos ecrãs, pois ainda não se sabem bem todas as consequências das tecnologias no desenvolvimento humano por se tratar de um fenómeno recente, mas já se assiste ao aumento significativo por exemplo da miopia pelo excesso de concentração nos monitores. Sabe-se que, um cérebro que não brinca livremente e que, uma mente que não se desliga da informação, está inibida de outros conhecimentos essenciais para o desenvolvimento.
 
Estes poucos exemplos já são mais do que suficientes para sair de casa e apanhar luz natural, depois deve-se proibir o uso desses equipamentos antes de dormir, porque aumentam o estado de vigilância de um cérebro que deveria estar a preparar-se para descansar e dormir bem.
 
Sabemos também da importância do contacto entre seres humanos para nos desenvolvermos enquanto pessoas.
 
Se um adulto teve oportunidade de se relacionar com outras crianças e jovens no seu tempo, os filhos digitais acabam por não passar por essa importante experiência de relação comunicando à distância.
 
Algo tão simples quanto os sons, os cheiros, os toques entre humanos, acabam por ser substituídos por teclas e imagens que nem sempre correspondem à realidade.
 
E o que dizer da obesidade de quem não se mexe porque não mais precisa do que de mente, dedos e olhos? Saberá a resposta, pelo que pode aceitar a importância da caminhada, da bicicleta, do futebol ou qualquer outra atividade que divirta a família, pois todos precisam desses momentos de descompressão.
 
Os adultos também passam demasiado tempo sentados e focados no seu quotidiano. Tranquilizar a mente de forma alegre e descontraída faz bem a todos.
 
É inevitável que adultos e crianças estejam ligados à tecnologia, agora podem fazê-lo de forma correta, com horários, restrições e momentos para isso. O restante tempo, tem de ser vivido com qualidade e descontração, com outros estímulos e sensações.
 
Não leve o telemóvel quando vai passear, muito menos para a praia ou para esses momentos de descontração! Quando regressar, logo atualiza a informação e responde a quem tentou contactar nesse momento. Não permita que as tecnologias comandem as suas ações, inverta o processo e use esses recursos a seu belo prazer!
 
Comece já hoje a fazer a diferença. Em três dias consecutivos, verá que todos já estão a pensar de forma distinta e mais virada para fora do que para dentro das tecnologias. Não custa mudar, basta saber o que se quer mudar e o que se quer fazer em alternativa.
 
Fátima Fernandes