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Saiba se tem algum trauma que não foi ultrapassado

Saiba se tem algum trauma que não foi ultrapassado
Saiba se tem algum trauma que não foi ultrapassado  
Foto Freepik
Os estudos revelam que, muitas pessoas têm “dores da infância arquivadas” e não sabem, mas acabam por vê-las refletidas no seu dia a dia.

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Trabalhos levados a cabo por psicólogos da Duke University Medical School revelam que 78% das crianças relataram ter passado por mais de uma experiência traumática antes dos 5 anos de idade. A partir dos 6 anos, 20% relataram experiências traumáticas, variando desde abuso sexual a negligência emocional, exposição a violência doméstica e perda traumática.

Os especialistas alertam: «pessoas que sofreram um trauma de infância podem vir a desenvolver um transtorno de stress pós-traumático complexo (PTSD-C), um problema caracterizado por dificuldades na regulação emocional, perceções distorcidas de abuso, dificuldades nas relações interpessoais e somatização».

No entanto, «muitas vezes não estão conscientes de que têm um problema cuja origem se volta para a infância. As vítimas acreditam que deixaram o seu passado para trás, mas ele persegue-as inconscientemente».

Uma publicação da Aleteia lembra que, «A formação de identidade é um processo complexo que ocorre ao longo da vida. A construção da identidade, incluindo o sentimento de ser suficientemente bom, a capacidade de integrar harmoniosamente emoção e razão, a consciência básica do estado emocional, sentir-se seguro e saber quem somos realmente, é afetada pelos traumas de infância. O que acontece é que a sobrevivência básica prevalece sobre o desenvolvimento equilibrado do “eu”.

Nesse sentido, «um trauma em tenra idade pode alterar o desenvolvimento do cérebro».

Um ambiente onde prevalece o medo e a negligência, gera diferentes adaptações dos circuitos cerebrais, em comparação com um ambiente onde a criança se sente segura, protegida e amada. E o pior é que, quanto mais cedo essa angústia for vivenciada, mais os efeitos serão profundos e duradouros, realça a publicação.

Portanto, muitas vezes a identidade de um adulto que sofreu traumas de infância está organizada em torno da necessidade de sobreviver e alcançar um nível básico de segurança nas relações com os outros. Isso leva-o a um círculo vicioso no qual, por um lado, revive experiências desencorajadoras e traumáticas e, por outro lado, tende a evitar experiências orientadas para o crescimento, conduzindo a que se desligue de si mesma.

As pessoas que guardam um trauma profundo costumam dizer este tipo de frases:

1. Perda da infância – “Eu não tive uma infância” Não se lembram das primeiras fases de vida.

 E, mesmo que recuperem alguns acontecimentos, estes apresentam-se como desgarrados de uma narrativa com sentido, o que lhes compromete o dia a dia mesmo enquanto adultos.

2. Perdeu parte de si mesmo – “Sinto que perdi alguma coisa, mas não sei o que é” e mostram-se sempre insatisfeitas e com a sensação de que lhes falta algo importante.

Como consequência desta dissociação, quem passou por um trauma de infância poderá querer tornar-se, por exemplo, num estudante modelo porque abdicou de áreas sensíveis de vida e deu ênfase a outras mais materiais como compensação - que faz com que as emoções fiquem esquecidas, tal como o autoconhecimento, a socialização, a convivência social e tudo o que envolva contactos próximos e íntimos, bem como fica comprometido o autoconhecimento porque a pessoa foge de si mesma.

3. Fugir de si mesmo – “Eu sinto-me mal quando penso em mim mesmo”. Esta reação acontece sobretudo quando o trauma está ligado aos pais ou irmãos que são pessoas mais próximas e que deveriam ser mais íntimas. A pessoa evita pensar em si mesma para distanciar-se daquilo que lhe provoca sofrimento e acaba por abandonar-se, a desenvolver sentimentos de frustração, de vazio, dificuldades em construir um projeto de vida, em valorizar-se, gostar de si e daí por diante. Em muitos casos, optam por comportamentos autodestrutivos até que peçam ajuda ou que consigam aprofundar as emoções negativas, dar-lhes um novo significado e sentido e reinventarem-se.

4. Relações destrutivas – “Sinto atração por pessoas que me magoam”. Uma pessoa que tenha sido muito ferida pelos pais, tende a deixar-se magoar e prejudicar por pessoas mal-intencionadas. Não tem força para defender-se, nem sequer sabe como fazê-lo e, há sempre quem se aproveite dessa fragilidade. Dizem muitas vezes que atraem pessoas negativas, seja no trabalho, na vida amorosa, nas amizades e não entendem que, o facto de não se protegerem dessa toxicidade resulta dos problemas de infância mal resolvidos e da permanente sensação de que estão no mundo “por piedade”. É comum que atraiam narcisistas, abusadores de algum tipo e que dependam dessas pessoas que se dizem ser “os seus salvadores”. A pessoa depende destes agressores e não consegue sair da sua rede, sabe que não está no bom caminho, mas não consegue viver sem ela e, em muitos casos, nem com ela, o que aumenta a insatisfação, a frustração e a perda de prazer pela vida, podendo isolar-se e perder a esperança nas relações.

5. Desconexão emocional da identidade – “As emoções são um obstáculo”. Quando a família não nos acolhe e não permite o desenvolvimento de emoções positivas, acabamos por afastar-nos do mundo emocional e da nossa própria identidade. Ao aprender a esconder as emoções, não as desenvolve, não consegue geri-las, nem assumir o que sente em cada momento, o que prejudica a forma como vê o mundo e como se vê a si mesmo, quase como se estivesse separado da dimensão emocional e se tivesse de concentrar-se apenas no domínio material, mas no fundo sente, mas está desorganizada e não sabe reconhecer as emoções.

O problema é que precisamos das emoções até para tomar decisões na vida. A desregulação emocional desconecta-nos da nossa intuição, e pode levar-nos a tomar decisões erradas nos vários contextos de vida; até no casamento.

As consequências dos traumas de infância são devastadoras até ao momento em que aceitamos voltar ao passado, identificar o que nos aconteceu e assumir uma posição sobre nós mesmos, encontrando o nosso “eu” e passando por um processo de autoconhecimento de modo a transformar essa apatia forçada em vontade de viver. E, isso pode começar assim:

1. Admitir que agora estamos seguros, que já não somos aquela criança assustada que passou por tantos medos e dor. Hoje temos o poder de decidir com quem queremos estar e reconhecer que não queremos voltar atrás, nem estar com aquelas pessoas que nos magoaram tanto.

2. Apesar de sermos adultos, devemos aceitar que alimentamos medos, inseguranças, instabilidade, revolta, ansiedade e daí por diante quase como se fossemos crianças e se ainda estivéssemos expostos àquele cenário assustador. Só assim poderemos tomar consciência de que já passou, que estamos seguros e prontos para lidar bem connosco próprios e depois com aqueles que nos valorizam, acarinham e incentivam.

O processo não é fácil porque implica reprocessar várias camadas da nossa identidade para que se possa dar lugar a algo novo, pelo que, a ajuda de um psicólogo pode ser valiosa, mas não se esqueça que, o maior e melhor investimento que pode fazer é em si mesmo, concluem os entendidos nesta matéria.