O Algarve Primeiro falou com 4 escritores da nova geração, Lourenço Seruya, Bruno M. Franco, Filipa Amorim e Fábio Ventura, este último, natural de Portimão. Partilharam o seu encanto pelo policial, suspense e thriller, mas também as suas motivações para criarem "aventuras" no mundo da escrita.
AP: Quatro escritores da nova geração que têm em comum o gosto pelo policial / suspense / thriller, três vertentes muito populares em Portugal. Como explicam esta tendência nacional?
Fábio Ventura – Considero que não é tendência só em Portugal, mas no mundo inteiro. Pela sua natureza, estes géneros agarraram o leitor e espicaçam a sua curiosidade com os mistérios e reviravoltas aplicados, muitas vezes com temas mais obscuros, com os quais nos identificamos. São géneros que conseguem dar aquele escape tão necessário para as nossas rotinas e, ao mesmo tempo, retratam a condição humana com tudo o que ela tem de bom… e de mau.
Lourenço Seruya – Pelo que tenho visto, é uma tendência mundial. Este género literário figura sempre nos tops de vendas pelo mundo fora. Felizmente, em Portugal, nos últimos cinco anos, as editoras têm apostado em autores portugueses de policiais/thrillers, e o público tem aderido bastante. Creio que este interesse e fascínio pela literatura policial tem que ver com o facto de o ser humano ser curioso e gostar de mistérios, e também pela adrenalina que sentimos com reviravoltas. Os policiais/thrillers assentam bastante no fator surpresa e as histórias são construídas de forma a que os leitores sejam surpreendidos frequentemente, o que os deixa cativados e imersos nas narrativas.
Bruno M. Franco – O policial é um género que pela sua natureza atrai muitos leitores. Quem pega num policial, sabe que está perante uma história que o vai agarrar, que será desafiante, que terá mistérios por resolver, que terá muita adrenalina e que terá sempre presente o macabro ou, pelo menos, a morte. E não há nada que atraia mais a curiosidade das pessoas do que a morte e todas as suas consequências. Tanto os livros, como filmes e séries deste género, têm muitos leitores e espectadores precisamente por causa dessa curiosidade mórbida inerente ao ser humano. E nós jogamos muito com isso para prender e atrair leitores. Pessoalmente, é o meu género favorito e o que mais leio.
Na Feira do Livro de Portimão, o que vão apresentar? Depreendo que sejam novas obras.
Fábio Ventura – Estive presente no dia 26 de junho para apresentar o meu novo livro, O Sono dos Culpados (Suma de Letras), mas tive a honra e o prazer de ser convidado para apresentar os novos livros das minhas colegas Susana Amaro Velho (Descansos), Mafalda Santos (Aquilo que o sono esconde) e Filipa Amorim (A Noite da Tempestade).
Filipa Amorim – Venho apresentar o meu segundo livro, A Noite da Tempestade, um policial passado em Santa Cruz, Torres Vedras, tal como tinha sido o meu livro anterior, A Corrente. Desta vez, a história gira em torno da investigação ao homicídio de uma jovem, que aparece morta à porta da casa da protagonista, a Sofia, que não a conhecia nem faz ideia do porquê de a vítima ter aparecido ali. A Sofia é jornalista e também escritora de policiais, por isso não vai conseguir virar costas ao caso, envolvendo-se na investigação para trazer a verdade à tona.
Lourenço Seruya – Vou apresentar o meu quinto livro, Morte nas Caves. A história passa-se nas Caves Porto Ferreira, em Gaia, e começa com a descoberta de um cadáver durante uma visita guiada nesse local. O inspetor Bruno Saraiva, recentemente transferido para a PJ do Porto, é chamado para investigar este homicídio, e depara-se com um cenário desconcertante: o registo de saídas das caves indica que todos os colaboradores deixaram o edifício antes da hora da morte. Este é o ponto de partida, e posso adiantar também que a cidade de Porto é o pano de fundo desta história.
A literatura em Portugal, apesar de rica e diversificada, está num momento de viragem? Os portugueses ainda leem pouco, o que falta fazer para alterar esta realidade.
Fábio Ventura – É verdade que, estatisticamente, os portugueses leem pouco, especialmente se compararmos com outros países da Europa. No entanto, de ano para ano, as percentagens de leitores e de vendas de livros têm vindo a crescer, especialmente entre os mais jovens. Ler tornou-se cool e os autores portugueses, especialmente da nova geração têm beneficiado com essa tendência. Há muito mais apoio e valorização de autores portugueses, o que permite a entrada de «sangue novo» no mercado.
Filipa Amorim – Também tem havido, felizmente, uma cada vez maior aposta dos grandes grupos editoriais nas novas vozes da literatura nacional, não só nos «nomes de praça» já consagrados, como acontecia até há poucos anos. Isto porque já se percebeu que os temas, os enredos e a linguagem com que os novos autores escrevem é apelativa para uma nova faixa do público leitor. Indo ao encontro do que o Fábio disse, o mercado está sedento de sangue novo.
Bruno M. Franco - Há cada vez mais pessoas a ler e cada vez mais a preferirem os escritores portugueses aos estrangeiros. É um orgulho enorme para mim assistir de perto a esta mudança, principalmente pela dificuldade que tive em publicar o meu primeiro livro, Segredo Mortal, escrito há mais de dez anos, numa altura em que o mercado estava praticamente fechado aos autores portugueses e cheguei a pensar que nunca iria ser publicado. Mas tudo mudou para melhor.
Lourenço Seruya – Felizmente, os estudos recentes da Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, indicam que os portugueses estão a ler cada vez mais. A percentagem tem aumentado, sobretudo nas camadas jovens, e isso é muito estimulante e positivo. Creio que se poderia conquistar mais pessoas para a leitura se o preço dos livros fosse mais acessível, e se se mudasse as obras obrigatórias de leitura nas escolas. Se têm de existir livros obrigatórios no ensino, deverão ser mais apropriados às idades dos alunos. Porque a verdade é que as obras que eles têm de estudar têm o efeito oposto: afastam-nos dos livros e criam neles o sentimento de que “ler é uma seca”. Ler não é uma seca, e é logo quando eles são miúdos que lhes devemos mostrar que a leitura é uma atividade divertida e estimulante.
Como surgiu a aposta no mundo da escrita?
Fábio Ventura – Sempre tive uma enorme paixão pela arte de contar histórias e a literatura acabou por ser a «casa» perfeita para isso. A minha aventura pelo mundo da escrita começou em 2009, com uma grande interrupção pelo meio até regressar em 2020. Desde então, ainda não parei e tem sido um excelente porto de abrigo para conseguir domar a minha imaginação e criatividade. Nada melhor do que fazer isso escrevendo novas e originais histórias para os outros.
Filipa Amorim – Também comecei a escrever muito nova, com 10 ou 11 anos, inspirada pelos livros da saga Uma Aventura, das brilhantes Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada. Com elas, apanhei o «bichinho» de criar mistérios, de jogar com quem me lê na análise das pistas, a busca pelas respostas, o «eureka!» quando se desvenda o final, e nunca mais perdi o prazer por este jogo que se concretiza tão bem na escrita.
Lourenço Seruya – Surgiu quando estava desempregado. Quando acabei o curso, tive trabalho como ator durante 2 anos consecutivos. Ao fim desse tempo, fiquei desempregado. Como tinha muito tempo livre nessa altura, decidi aproveitar para tentar escrever um livro, que era uma vontade que já pairava sobre mim desde os meus 7 ou 8 anos. Desde essa idade que fiquei fascinado com a possibilidade de criar histórias e personagens. Portanto, depois de ter escrito o primeiro livro, naquela altura sem trabalho, enviei-o para editoras e ele foi publicado em 2021.
Bruno M. Franco – Comecei a escrever aos 14 anos, quando um episódio negro na minha vida me levou a sentir a necessidade física de expelir o que sentia como resultado desse evento catastrófico. Comecei a escrever e senti um alívio e uma satisfação tão grandes que nunca mais parei. É um dos grandes prazeres da minha vida.