Curiosidades

O que se passa na cabeça de um agressor?

 
Este é sempre um tema atual e que desperta muita curiosidade, sobretudo porque há sempre novos conteúdos para serem analisados, sem esquecer que, qualquer um de nós pode coabitar ou viver perto de um agressor, daí ser tão relevante conhecer os seus principais traços para se poder proteger.

Neste artigo vamos resumir aquilo que de mais pertinente cada um de nós deve saber sobre um agressor para que melhor se possa proteger e, ao mesmo tempo, apresentar a posição de alguns autores que estudam a matéria para que possamos  dar mais consistência ao conteúdo.
 
Nunca é demais lembrar que, a violência pode ocorrer em qualquer cultura, extrato social e pode ser praticada contra crianças, jovens, adultos ou idosos. Depois, é de evidenciar que, segundo organizações internacionais, a violência de género pode ser classificada em cinco tipos: violência física, violência sexual, violência psicológica de controle, violência psicológica emocional e violência económica.
 
Em relação ao que se passa na cabeça de um agressor, as opiniões dividem-se entre os investigadores que defendem uma doença mental e aqueles que se posicionam no tipo de educação como reflexo desses comportamentos abusivos.
 
Também é de considerar que, as mulheres são o principal alvo dessas agressões, mas que acabam por silenciar a situação devido a três fatores:  
 
1-Por não darem importância suficiente à violência sofrida.
 
2-Por medo de retaliação.
 
3-Por vergonha.
 
Relativamente ao agressor, importa saber que este, regra geral, é controlador, acredita que tem direito a tudo, distorce a realidade conforme a sua vontade, não respeita o parceiro e considera-se um ser superior ao outro. 
 
O agressor também  confunde amor com abuso, é manipulador, esforça-se por criar uma boa imagem pública, nega e minimiza o seu abuso e é possessivo.
 
É também de evidenciar que, apesar de um agressor poder reunir todas estas características, nem todos as possuem de igual modo, o que também pode dificultar a identificação de um indivíduo designado como agressor.
 
Na mesma sequência, também é de anotar uma outra razão pela qual a vítima dá inúmeras oportunidades ao agressor, pois para além do medo, da vergonha e de minimizar o abuso, também existe um ciclo de violência típico destas personalidades que fazem com que a vítima acredite que ele vai mudar. Para que se perceba melhor o que se passa, a psicóloga americana Lenore Walker estabeleceu o ciclo clássico de violência para explicar como as pessoas que sofrem abusos passam por uma série de fases cujo ciclo se repete cada vez que ocorre uma agressão.
 
Este ciclo consiste em três fases principais:
 
1-Fase de acumulação: há uma escalada gradual de tensão com atos discretos. Podem ocorrer ofensas, comportamentos desagradáveis ou abusos físicos. A vítima tenta diminuir a raiva do seu agressor e tenta evitar que o surto do comportamento ocorra. Aos poucos, o desamparo aprendido vai se estabelecendo na mulher, ou seja, a crença de que tudo o que faz não pode evitar o abuso.
 
2-Fase de explosão: a tensão continua a aumentar e o resultado é a explosão de ataques verbais e/ou físicos que podem deixar a mulher gravemente afetada ou ferida.
 
3-Fase de “lua de mel”: o agressor pede desculpas, tenta ajudar a vítima e é gentil, atencioso, enquanto dá presentes e faz promessas. O agressor garante que conseguirá controlar a sua agressividade e a mulher deseja acreditar nele. Na mente destas pessoas pode ser criada a falsa esperança de uma mudança real. Nessa fase, geralmente há ausência de tensão, mas com o passar do tempo o ciclo de abuso torna-se crónico e essa fase desaparece, o que dará lugar à repetição da violência.
 
Também importa conhecer os tipos de abusadores e, nesse contexto, os especialistas apontam dois grupos de investigadores (Gottman et al., 1995; Holtzworth-Munroe e Stuart, 1994) que, há mais de uma década, orientam o debate sobre os tipos de homens violentos contra as suas parceiras.
 
A classificação feita por Holtzworth-Munroe e Stuart (1994) é baseada em três variáveis: o funcionamento psicológico do agressor, a extensão da violência e a gravidade dos comportamentos. Como resultado, estes entendidos descrevem três categorias gerais:
 
1-Abusadores excessivamente controlados: são violentos apenas no ambiente familiar, com a parceira e os filhos. A violência ocorre com menos frequência e gravidade, sendo as agressões sexuais menos prováveis. Não é comum que apresentem psicopatologia associada.
 
2-Abusadores impulsivos: violentos no ambiente familiar com as parceiras e filhos e, ocasionalmente, com outras pessoas. Praticam atos de  violência psicológica, física e sexual. Apresentam maiores problemas psicológicos, sendo frequente o transtorno de personalidade limítrofe com raiva crónica e depressão. Estes indivíduos justificam a violência como uma forma impulsiva de descarregar a tensão interna acumulada.
 
3-Abusadores instrumentais: violentos com a família e também noutros ambientes. A violência exercida é de natureza instrumental, ou seja, para alcançar objetivos e como estratégia de enfrentamento. Atitude fria, narcisismo e manipulação psicopática, comorbidade com transtorno de personalidade antissocial e uso de drogas são frequentes. Justificam a violência e é comum que tenham problemas jurídicos por outros crimes.
 
No que se refere à origem do problema, os investigadores clarificam que, os agressores exibem personalidades muito diversas, tenham tido uma infância difícil ou não. A agressão não é produto das deficiências emocionais ou da falta de habilidades sociais de um homem. Na realidade, a agressão surge da formação cultural de um indivíduo, dos modelos masculinos e da criação. Lundy Bancroft aponta que, «a agressão é um problema de valores, não um problema psicológico».
 
Ainda neste ponto, é preciso estar atento a alguns fatores essenciais: a agressão pode ser aceite e desculpabilizada devido a crenças enraizadas como sendo “ele é assim, “ “o pai dele já era assim”, ou “os homens são agressivos, está na sua natureza”, pois estes mitos fazem com que se tolere e aceite o que é condenável.
 
Seguidamente, há quem justifique as agressões com o consumo de drogas, na sua maioria o excesso de álcool, o que, na posição dos especialistas também não pode explicar a agressão, muito menos servir de base para a sua aceitação.
 
Todos também devemos ter em conta que, ter uma doença mental não torna ninguém necessariamente violento, tal como ser portador de uma deficiência física não pode explicar esses atos. Ter sido agredido na infância não transforma inevitavelmente um homem ou mulher em agressores, pelo que devemos estar muito atentos e pedir ajuda quando nos deparamos com um qualquer cenário de violência, seja ela de que tipo for e contra quem for. Recorde-se a máxima, “Ninguém trata bem quem o trata mal”.
 
Uma pessoa que tem problemas com drogas, com uma infância traumatizante, que recebeu uma educação voltada para esses valores desviantes, terá sempre a possibilidade de pedir apoio especializado e melhorar a sua condição, mas para isso, o agressor deve assumir a sua responsabilidade sobre os seus atos, ir à raiz do problema e ser acompanhado para inverter a situação. Ser violento física ou verbalmente apenas agrava a sua forma de estar na vida e de se relacionar com os demais, alertam os especialistas.
 
Neste ponto, tenha em conta que, «qualquer agressor pode assumir o controle do seu comportamento e decidir mudá-lo. A questão é se está disposto a perder a sua posição de poder». Recorde-se que, a mente de um agressor é muito rígida e não tolera oposição ou resistência, sublinham os entendidos na matéria.
 
Depois, é ainda de evidenciar que, um agressor não é nem um monstro nem uma vítima. Muitas vezes, é um ser humano com um problema muito complexo e destrutivo que requer ajuda, para o bem das pessoas ao seu redor, mas também para o seu próprio bem. Em muitos casos, este tipo de pessoa não consegue mudar de um dia para o outro; uma estrutura tão complexa que está configurada há anos. É preciso tempo, talento, inteligência e profissionalismo. Não é a vítima que vai ajudar o agressor a resolver os seus problemas, mas sim o especialista na matéria que o possa ajudar a identificar os seus conflitos, a tomar consciência de si mesmo e a fazer todo um processo longo, mas positivo de recuperação.
 
Refira-se que, «o comportamento do agressor é principalmente consciente. Ele age deliberadamente, não por acidente ou porque perdeu o controle, mas o pensamento subjacente que guia o seu comportamento está tão arraigado que age sem questionar mais nada».
 
Na mesma sequência, é de registar que, um qualquer agressor aprende o seu comportamento a partir de várias fontes: importantes modelos masculinos, amigos, mensagens culturais, ambiente educacional, etc. Quando chega à idade adulta, já integrou esse comportamento a um nível muito profundo e as suas respostas são automáticas. Por  isso, «a sua mente já está totalmente configurada e é muito resistente a mudanças». Neste ponto, os psicólogos alertam para a importância de educar melhor desde cedo. Os pais devem educar para a igualdade de género e de oportunidades, para o respeito, sem violência, uma vez que, comportamento gera comportamento e um ato violento dará sempre lugar a outro ainda mais agressivo, sem esquecer que o amor e a compreensão devem fazer parte de todo o processo.
 
É de anotar que, «a agressividade é um problema de valores e atitudes. Para erradicar a violência doméstica e a violência na comunidade, precisamos de perguntar como estamos a moldar determinados comportamentos e pensamentos agressivos e sexistas». Só com esse exercício introspetivo, seremos capazes de evoluir, de mudar mentalidades e de reduzir a violência de qualquer espécie. Para isso, os pais precisam de ser chamados à razão, pois uma educação responsável e consciente pode realmente fazer toda a diferença desde a tenra idade.
 
Fátima Fernandes